Homem de Aço Filme

Homem de Aço | Ser “só” o Superman não é mais suficiente

O mundo do cinema pode estar tomado de “homens de ferro”, “capitães américas”, “homens-aranhas” e “batmans”, mas o que nem eles nem ninguém nega é que tudo isso só existe graças a um rapaz do Kansas com uma capa vermelha e uma cueca vestida por cima da calça. Constatação que joga uma imensa responsabilidade nas costas do novo Homem de Aço, afinal, fracassar naquilo que ele próprio inventou seria algo impensável, mais ainda se levado em conta a porcaria de foi sua última tentativa alguns anos atrás.

E a primeira coisa a deixar bem clara é que esse novo filme dirigido pelo mesmo Zack Snyder que já dialogou com os quadrinhos em Watchmen e 300, não decepciona ninguém que entrar no cinema com a expectativa de ver um recomeço nas telas do maior herói da cultura pop. Tanto para os fãs do Superman, quanto para quem só estiver soterrado pela mastodôntica campanha de publicidade que precedeu sua estreia.

Isso é resultado de um esforço válido para “rever” o personagem desde seu âmago e ter em mãos um novo produto cinematográfico, muito mais do que o de levar à tela um personagem clássico (se bem que até nos quadrinhos essa “visão clássica” também foi deixada de lado). E entre um visual divertido, muitos voos, um vilão muito mais decente (e mau) que o Lex Luthor de Kevin Spacey (Superman Returns) e uma nova gênese, esse novo Superman acaba pagando um preço que não atrapalha (nem atrapalhará) o resultado final, mas que torna Homem de Aço uma experiência falha.

Como se faltasse algo enquanto toda plateia do cinema permanece sentada ao final do filme esperando algumas surpresas depois dos créditos, antes de lembrar que aquilo não é uma produção da Marvel e ir embora.

(e a partir de agora podem aparecer um monte de spoilers sem aviso!)

Uma falha conceitual que não permite que aquele herói vindo de Krypton ainda bebê em um foguete, se torne o herói nato, que cresce, descobre seus poderes e, diferente de todo e qualquer herói (pelo menos foi o primeiro a seguir esse caminho) resolve ajudar o planeta que se tornou seu lar simplesmente por que pode. Porque percebe que todo esse poder pode ser usado para salvar a humanidade.

Nas mãos do roteirista David S. Goyer, com a concepção da ideia em parceria com Christopher Nolan, Superman acaba movido e empurrado na trama pelos pecados e conceitos de seus dois pais. Como se o receio de um simples “herói por ser herói” não bastasse.

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O problema é que, mesmo isso parecendo apenas um detalhe do roteiro, uma adaptação, um meio de se chegar a um final (maquiavelicamente falando), o estrago no personagem é óbvio. Sai o herói e entra em cena um cara meio amargurado, frio, em busca de respostas para seu passado e culpado pela morte do pai (e isso foi sim um spoiler!). Alguém humano demais. Trágico e sério. Quase como se um escorregão em uma caverna cheia de morcegos qualquer pudesse fazê-lo cobrir o rosto com dois chifrinhos e engrossar a voz.

O interessante disso, para sorte do espectador, é que no que se propõe essa “batimanização” do personagem (feita, justamente, pelos dois responsáveis pela trilogia recente) o resultado é pertinente e não se deixa escorregar. Homem de Aço é sério demais, mas faz isso em seus 140 e poucos minutos sem escorregar, como uma obra fechada e concisa.

Porém, esse novo Superman só não é mais parecido com seu parceiro de Gotham City, pois é mais semelhante ainda a um marceneiro de Jerusalém. E por mais que toda história cristã envolvendo Jesus Cristo esbarre naquele paradigma descrito por Joseph Campbell em seu estudo do mito do herói, o que, por consequência, traria à tona semelhanças com a história do “Último filho de Krypton”, Goyer (e talvez Nolan junto) e Snyder extrapolam isso e contam a história de uma criança enviada dos céus, que vive entre os humanos, aprende toda essa humildade e, aos 33 anos volta a encontrar com seu “pai” (em forma de espírito, só que não santo) durante uma peregrinação, descobre que foi mandado para a Terra para ser um salvador, é entregue à morte por seus próprios semelhantes, perde seus poderes (ou morre, tanto faz), revive e, ainda por cima, se joga ao espaço em forma de cruz (ufa!). No caso de Jesus, ele não volta à vida e enche o imperador romano de porrada, como o Superman faz com Zod (Um Michael Shannon que está “vilanescamente” perfeito no papel), mas é impossível não enxergar algumas semelhanças.

É claro que seria impossível fugir das referências (principalmente quando elas fazem parte do personagem e sempre farão), mas forçar esses pequenos detalhes como o voo em cruz e a idade, fazem até que uma simples matéria de jornal falando desse “misterioso salvador” (ponte do desenvolvimento de Lois Lane, vivida agora pela sempre ótima Amy Adams) soe como um monte de “seguidores bíblicos”. A sorte é que Zack Snyder parece tão entretido (e esforçado) em criar cenas de ação e lutas imensas e divertidas que esse lado “cristão” acaba ficando em um segundo plano, ainda que não se permita desaparecer. O que nem de longe faz bem para a história.

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A impressão que fica é que diante de toda ação muito bem posicionada e realizada, o personagem não precisasse de muito mais que suas motivações “clássicas” para funcionar perfeitamente, ainda mais diante de uma acertada decisão de “perder” tempo no começo traçando todo conflito entre Zod e Jor El (Russel Crowe no papel de Marlon Bran… quer dizer pai do Superman), o que ainda serve de modo satisfatório para mover o vilão em sua vingança contra a Terra e seu mais novo protetor.

O resto é perfumaria e serve muito mais para inflar uma trama que poderia ser direta e simples, o que afasta demais o público e dá oportunidade de fazer todos no cinema se pegarem pensando o quanto é contraditório Jor El e sua mulher irem contra um sistema kryptoniano que decide tudo que cada criança vai fazer e ser pelo resto da vida antes mesmo dela nascer, e para provar esse ponto de vista, enviam seu filho para um planeta distante e decidem (!?) que ele irá se crescer, ganhar poderes, se tornar um Deus e levar esperança, escolhendo até a roupa que o coitado irá usar para o resto da vida. Só esquecendo de contar para ele que no caso de destruidoras brigas com vilões tão poderosos quanto ele, levar o conflito para um lugar menos povoado é algo bem mais indicado do que derrubar meia dúzia de prédios com um soco.

E se esse primeiro momento serve bem de ponto inicial para a volta desse mito, só o tempo dirá se isso dará certo diante desse material bruto, mal humorado e pretensioso, mas que, em contrapartida, diverte com um nível de ação impressionante e altamente empolgante (além de um Superman vivido por Henry Cavill que convence em seu esforço). O que resta é esperar qual desses dois caminhos aquele rapaz do Kansas vai tomar, com a cueca pra dentro da calça, é verdade, mas ainda assim, bem longe de eternizar aquele “S” no peito de modo impecável e indiscutível.

Man of Steel” (EUA); escrito por David S. Goyer e Christopher Nolan; dirigido por Zack Snyder; com Henry Cavill, Amy Adams, Michael Shannon, Diane Lane, Russel Crowe, Christopher Meloni, Kevin Costner e Laurence Fishburn

Trailer do filme Homem de Aço

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