Um ano moderno demais até para o Oscar

É difícil entender o que se passa na cabeça desses “velinhos” que comandam a Academia de Ciências e Cinematografia de Los Angeles, ainda mais quando chega perto de sua premiação, o Oscar.

É verdade também que não posso dar toda opinião que eu gostaria sobre essas escolhas, já que as distribuidoras nacionais não se esforçaram o suficiente para que as pessoas por aqui pudessem acompanhar o Oscar com os filmes vistos com um mínimo de antecedência, mas mesmo assim é impossível não perceber o estrago que esta sendo feito.

Se depois de surpreender a todos com o Oscar de Guerra ao Terror a Academia de Cinema de Los Angeles pareceu propícia a seguir adiante com sua modernidade, premiar O Discurso do Rei, no ano passado, e preferir esquecer certos momentos do cinema de 2011 a voltar às mesmas teclas desgastadas mostra que aquele suspiro de vitalidade foi só um suspiro mesmo.

Como eu disse não poderia ir contra certas escolhas que não vi (e até pretendo fazer isso, assim que vê-las), mas, logo de cara ao perceber que Cavalo de Guerra se encontrava entre os indicados a Melhor Filme, junto com um amargor na boca me veio a sensação de que, talvez, essas pessoas que comandam o maior prêmio do cinema mundial não estejam mais em sintonia com o próprio cinema mundial.

Williams e Spielberg, dois gênios lembrados pelas razões erradas.

É lógico que essa hora as pessoas já devem ter me xingado e colocado em prova meu conhecimento de cinema, mas é justamente o mesmo Spielberg melodramático e descontrolado de Cavalo de Guerra que acabou sendo injustiçado pela ausência de seu As Aventuras de Tintim entre as animações. Então, o problema não é o diretor “intocável”, mas sim a Academia perdida sem saber o que fazer com toda essa modernidade.

Pior ainda, em um dos mais fracos momentos de sua carreira, John Williams, desesperado por manipular seu espectador no mesmo Cavalo de Guerra também é lembrado, um sinal de que ou a Academia já começou a lembrar dos amigos para fazer sua festa ficar mais “bacana”, ou eles, realmente, se tornaram preguiçosos demais para diferenciar o bom do ruim sem olhar para o dono da obra. A título de curiosidade, o mesmo Williams esbanja sutileza na adaptação de Tintim, mas não vou falar mais sobre o jornalista belga.

Mas como o assunto aqui é pegar no pé, fica igualmente difícil engolir a indicação de Missão Madrinha de Casamento por seu roteiro, que deve ter seus fãs, mas ainda assim faz ser difícil acreditar que nenhum outro roteiro original fosse melhor que uma diarréia em um vestido de noiva no meio da rua. Talvez eu até citasse uma meia dúzia, mas com isso seria mais difícil ainda que o leitor conseguisse acabar esse texto sem estar mais bravo ainda comigo.

Também é lógico que o Oscar deu orgulho em um outro punhado de pessoas ao lembrar de Terence Mallick em seu A Árvore da Vida o que mostra que ainda há esperança de dias melhores (mesmo sem ter visto O Artista, que deve levar a maioria dos prêmios da noite e deve manter o nível). Ainda que talvez, a presença de Mallick mostre exatamente isso, que a Academia ficou para trás em seu próprio tempo.

Mallick é um velho conhecido da Academia, Spielberg idem, assim como Willians, e, praticamente todo resto dos indicados à Melhor Filme. Sabe esse Tão Forte e Tão Perto que até agora ninguém tinha falado sobre ele, pois é, é do três vezes indicado ao Oscar Stephen Daldry, de Billy Elliot, As Horas e O Leitor, figurinha mais que carimbada na última década de premiação. Nem o aparentemente desconhecido Bennet Miller é tão desconhecido assim, já que foi indicado por seu “Capote”. É lógico que o francês Michel Hazanavicius pode surpreender todos e levar para casa a estatueta, mas ainda assim ele deve estar se sentindo bem sozinho dentro desse “clubinho”.

E ainda assim O Artista pode sair ganhando, justamente, por ir em busca do cinema clássico, do mesmo modo que a Academia parece feliz em voltar a olhar. Mesmo que tipos como Drive, que vem sendo elogiado, desde que estreou, justamente por sua contemporaneidade (assim como o trabalho de Ryan Gosling, é o que parece, também devia ter sido lembrado) acabe passando completamente despercebido pela Academia. Em um ano morno e sem graça, onde poucos novos nomes tentaram algo diferente, o Oscar vai então em busca de premiar a mesmice ao invés de arriscar que a grande festa do cinema mundial homenageie o cinema que tenta ser novo.

e a Academia continua acreditando que culpa é dos efeitos especiais

Preferindo ignorar a obra de arte de Lars Von Trier, Melancolia (e nesse embalo fazendo uma enorme injustiça com Kirsten Dunst) só por que o diretor dinamarquês fez uma piada em Cannes que ninguém entendeu (e que sim, é engraçada e faz sentido), ou indicar os efeitos especiais de Planeta dos Macacos – A Origem só para deixar claro que ator de verdade aparece de verdade, e que no caso do macaco Cesar aquilo eram pixels falando e não (o injustiçado) Andy Serkis.

E esse é o mesmo Serkis que também emprestou seu corpo para ser “virtualizado” na pele do capitão Haddock em As Aventuras de Tintim, aquele mesmo que foi esquecido e que eu falei que não ia mais tocar no assunto e que mostra que, talvez, a Academia esteja apenas tentando ignorar qualquer disputa nesse plano maquiavélico de dar seu primeiro Oscar para um filme 3D, aproveitando a presença de seu velho conhecido Scorsese entre os indicados. Para esse bando de velinhos, talvez, então, fazendo disso o ápice de sua modernidade.

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