Sem Túmulo | Não é universal de propósito

*o filme faz parte da cobertura da 43° Mostra Internacional de Cinema de São Paulo


[dropcap]O[/dropcap] cinema do Oriente Médio em geral exporta para o mundo filmes que esmiúçam relações sociais e familiares, e têm se saído bem no Ocidente, principalmente, por nos oferecer essa discrepância de culturas. Sem Túmulo não é exceção, construindo através de sua pequena janela de dois dias uma compilação de sentimentos remoídos do passado de uma família, mas, infelizmente, esquece de se conectar com seu espectador.

O que inicia a história é a morte de um homem já idoso, no fim inevitável de sua vida. Porém, uma informação importante que é guardada por muito tempo é que ele se matou com a ajuda de Majid, seu cuidador, com uma década ao lado dele. Os motivos por trás desse ato final e das motivações de Majid serão revelados em momento oportuno durante a viagem para seu sepultamento, com seus dois filhos e filha, em um vilarejo que ninguém conhece, mas que faz parte do último desejo de seu pai.

Se você não é um espectador de primeira viagem já consegue imaginar sem muita dificuldade onde tudo isso vai dar. Entretanto o diretor estreante Mostafa Sayari nos entretém construindo um clima tenso entre os envolvidos, sozinhos na estrada e com muitas questões mal resolvidas pelo caminho. É o drama clássico da falta de comunicação entre os integrantes da jornada.

Os enquadramentos que Sayari evocam significados melhores que os diálogos escritos a seis mãos. Uma mulher se aproxima timidamente do seu irmão mais impulsivo e sua face fica escondida por trás das paredes do automóvel que os separam. Ainda dentro do mesmo automóvel um homem observa o passado de seu pai, mas é o reflexo no espelho que nos indica a direção no tempo. Existe uma metáfora óbvia que a história sugere sem nunca afirmar: a diferença entre pais e filhos não ser suficiente para libertá-los do seu destino de repetir as mesmas ações. Neste filme a metáfora é mais sutil: observamos o comportamento dos filhos tentando entender a personalidade do pai, que nunca vemos vivo.

Mas quisera eu que o filme fosse tão significativo assim. No fundo ele não é, e o que o Sayari mais faz é brincar com possibilidades, sem nunca se decidir qual caminho tomará em sua mensagem. E na impossibilidade de concluir, resolve pela passividade e introspecção, o que é frustrante a ponto de questionarmos se no fundo nunca valeu a pena nos dedicarmos a observar essas pessoas.

Sem Túmulo não se beneficia de suas atuações de maneira tão clara quanto sua fotografia, que revela através das sombras e das luzes em seus atores o humor do momento. Mas isso não é suficiente para que haja conexão com o espectador. Há longas pausas no filme que serve mais para contemplarmos que beleza de fotografia, que harmoniza com o deserto a sua paleta árida de cores, mas nunca temos muita ideia do porquê.

Até a violência no filme é insípida e frustrante. É sugerida uma vez, onde apenas vemos como consequência alguém limpando o punho sangrando, e mostrada em outra, e em nenhuma delas gera qualquer reação no espectador. Sabemos que há atrito entre essas pessoas, mas o ato inevitável se torna meramente simbólico; uma simbologia inacessível, que aos poucos se torna banal.

Se revelando como mais uma novela de costumes para entreter o ocidental que deseja sentir momentos de uma vida impossível em sua própria cultura, Sem Túmulo não é universal de propósito. É marketing iraniano, desses para crítico de cinema aplaudir. Mas o que o espectador comum não sabe é a dificuldade de se aplaudir um filme apenas por ter sido produzido no Irã. Às vezes até de assisti-lo. Felizmente neste caso não é para tanto.


“Hamchenan Ke Mimordam” (Irã, 2018), escrito por Behnam Abedi, Hamed Hosseini Sangari e Mostafa Sayari, dirigido por Mostafa Sayari, com Madjid Aghakarimi, Nader Fallah e Elham Korda.



Trailer do Filme – Sem Túmulo

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