Os Melhores Anos de Nossas Vidas

Para muito gente, por se tratar de pessoas reais em histórias reais e uma barreira tão fina quanto a lente do diretor, os documentários são apenas uma câmera ligada. E felizmente essas pessoas, na maioria das vezes, acabam surpreendidas quando dão de cara com os-melhores-anos-de-nossas-vidas-poterproduções como Os Melhores Anos de Nossas Vidas, que pregam a verdade, mas são carregadas muito mais pela sensibilidade do que por qualquer outra técnica.

E isso acontece, principalmente, por se tratar de um assunto tão sensível como a Hanseníase e, mesmo assim conseguir um resultado tão esperançoso e leve que surpreende qualquer um que der de cara com o filme de 2003. Dirigido por Andrea Pasquin, o filme então não se deixa levar pelo óbvio, pela dor ou pelo preconceito, mas sim por essas pessoas e suas histórias. Que valem cada segundo do documentário.

Pessoas que, nesse caso, são os moradores do Sanatório Santo ngelo, em Mogi das Cruzes (inteior de São Paulo). Um grupo que, como um deles mesmo faz questão de lembrar foram colocados lá somente para esperar suas mortes. Um grupo de jovens que se descobriram portadores do Mal de Hansen (Lepra) e que desde a década de 30 acabou isolado do mundo em um espécia de campo de concentração. Os anos demonstraram então que a doença não era tão letal como se imaginava, assim como em pouco tempo se tornou perfeitamente tratável (hoje é completamente curável).

Porém, a simplicidade com que a doença foi controlada é opostamente proporcional ao preconceito que nasceu dela. Um preconceito que até hoje ainda existe movido por um total desconhecimento do problema. Um preconceito que acabou obrigando esse grupo a ser esquecido pelo mundo por trás desses portões, grades e arames farpados. Um preconceito que culminou então em algo tão perto da criação de uma sociedade própria dentro desse sanatório que é impossível não tomar um susto com tudo que realmente aconteceu naquele pedaço de mundo deixado para trás.

E o principal acerto de Os Melhores Anos de Nossas Vidas é descobrir esse mundo, discutir o assunto preconceito e tocar em feridas ainda abertas com um sutileza enorme. Uma escolha que não esconde os relatos cheios de dor e tristeza dos entrevistados em um primeiro momento, mas não se mostra refém melodramático da doença ou da situação, mas sim tremendamente interessado nessas pessoas. Sem esfregar na cara nada a não ser seus personagens, que nesse caso podem ter sofrido tudo isso, mas conseguiram se sobrepor aos problemas e fazer o que nenhuma autoridade nem pensava que eles pudessem conseguir: viver.

Um documentário que está muito mais interessado em buscar um significado para seu título. Não em termos práticos, já que nesse caso isso fica óbvio em certo momento, mas um que seu espectador consiga descobrir aos poucos, escutando cada uma dessas vítimas de uma doença tão dolorosa, mas que sobrepujaram todas as dificuldades por elas mesmas. E quando se dá de cara com uma delas “abençoando o Sanatório” pelos anos que ele lhe deu e pela felicidade, soa com um tapa na cara de uma sociedade que acharia impossível que tal declaração surgisse sem nenhuma maldade. E surge. E é completamente verdadeira.

Os Melhores Anos de Nossas Vidas então é sobre as sequelas internas de cada uma dessas pessoas, não doentes, mas sim moradores que ajudaram a criar uma sociedade em que cada um deles pudesse ser aceito independente de qualquer doença. Uma sociedade que, realmente, ficou esquecida pelo tempo, mas que não se importa muito com isso, já que seu mundo sempre foi e sempre será cercado por aquelas barreiras, não só físicas, mas também aquelas mais intransponíveis: as da ignorância e do preconceito.

Mas sobre isso, bom, pelo menos os moradores de Santo ngelo sabem que não teriam problema em ter que encarar essa sociedade cheia de falhas que decidiu se afastar deles. Azar de quem ficou de fora desse muros.


Idem (Bra, 2003) dirigido e escrito por Andréa Pasquini


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