Crítica do filme O Físico.

O Físico

Adaptação da excelente obra homônima de Noah Gordon, O Físico possui um elenco eficiente e conta uma história interessante. Infelizmente, mesmo com seus cenários deslumbrantes e longa duração, o filme está longe de ser um épico, deixando muito a ser dito e explorado.

Ambientada durante a Idade Média, a história tem início na Inglaterra quando o protagonista Rob Cole (Adam Thomas Wright) era um garoto prestes a perder a mãe da temida doença lateral (a até então misteriosa – e fatal – apendicite). Quando ela morre, Rob vai atrás do Barbeiro (Stellan Skarsgård) que acaba de deixar o vilarejo, desejando aprender mais sobre doenças e suas curas. Logo passamos a acompanhar Rob já como um jovem homem (agora vivido por Tom Payne), habilidoso com os pacientes e cada vez mais curioso sobre o corpo humano e o que o faz parar de funcionar – o que o leva a buscar, impaciente, as informações que o Barbeiro não pode oferecer.

Finalmente, ele conhece um grupo de judeus que consegue curar a catarata e, assim, fica sabendo do grande Ibn Sina (Ben Kingsley), um médico brilhante que ensina em uma universidade na Pérsia. Rob, portanto, decide se passar por judeu (a universidade aceita apenas judeus e muçulmanos) e atravessar o mundo para se formar médico.

O diretor Philipp Stölzl filma tanto seus atores quanto os belos cenários desérticos de forma convencional, não cometendo erros grosseiros mas também não criando nada fora do lugar-comum. Com o auxílio do design de produção, contudo, ele ao menos transmite bem a diferença dos avanços tecnológicos e intelectuais entre a Europa e o Oriente, conseguindo inclusive demonstrar rapidamente que a Inglaterra também evoluiu um pouco nos anos em que Rob esteve ausente. Da mesma forma, a trilha sonora não chega a incomodar e não tenta, por exemplo, nos forçar a experimentar sentimentos e emoções ausentes na tela – por outro lado, é típica de um filme “épico” pouco memorável.

Se tecnicamente O Físico acerta apenas ao não ser desastroso, o grande problema da adaptação encontra-se em seu roteiro, assinado por Jan Berger. Obviamente tentando encaixar o máximo possível do longo livro de Gordon em suas 2h30 de duração, o filme acaba tocando de leve em vários de seus temas e tornando-se episódico, com um acontecimento dando lugar a outro sem que o assunto anterior tenha sido finalizado. Assim, a ótima dinâmica entre Payne e Skarsgård é desperdiçada pelo pouco tempo que passamos com o Barbeiro, e é apenas o talento do ator sueco que consegue tornar aquele personagem interessante o suficiente para que fiquemos satisfeitos ao reencontrá-lo.

O Físico Filme

Como protagonista, Payne é carismático e mostra-se capaz de comandar um filme – mas, novamente, é prejudicado pelo roteiro. Na adaptação, Rob Cole resume-se a duas características principais: ele quer aprender o máximo que puder sobre medicina e é um cristão fingindo-se de judeu. Aliás, enquanto O Físico faz um ótimo trabalho de demonstrar como a ignorância religiosa atrapalha os avanços da ciência, os conflitos religiosos retratados no longa são tão pouco discutidos que, quando uma batalha é iniciada na cidade de Isfahan, a impressão é de que o diretor simplesmente pensou que faltava ação ao longa e, para consertar isso, resolver incluir aquelas sequências. O fato de a batalha ainda servir como um deus ex machina ao ser iniciada justamente quando dois personagens estavam prestes a ser decapitados mostra ainda mais a ineficácia do roteiro.

O que é uma pena, pois há muitos elementos interessantes em O Físico. Apesar da falta de conhecimentos e da precariedade de sua situação, o Barbeiro é um homem que obviamente deseja ajudar seus pacientes e busca ensinar seu ofício a Rob. A Pérsia era muito mais avançada do que a Inglaterra mas, mesmo assim, ambos compartilhavam da crença religiosa de que o corpo humano deve permanecer intocado após a morte para poder reencarnar, algo que impedia que os estudantes – e profissionais – realmente aprendessem como funciona o corpo de um ser humano. O fascínio de Rob pelo conhecimento, desde seu sorriso de empolgação ao realizar com sucesso sua primeira amputação até sua surpresa ao encontrar dezenas de livros e pergaminhos dedicados a um único tópico, nunca deixa de contagiar o espectador. Da mesma forma, seu questionamento desde criança dos planos de Deus (“Nós precisamos mais dela do que você”), com a morte de sua mãe, são a fundação para que ele seja capaz de quebrar regras tão fortes de sua religião em nome de sua curiosidade científica.

Isso tudo, porém, é cercado pela falta de ousadia dos realizadores. O Físico é, portanto, um filme que vale a pena ser conferido mas que, infelizmente, apresenta mais potencial do que resultados. Se ao menos levar mais gente a ler o livro de Noah Gordon, ao menos, já terá compensado a fraqueza de sua adaptação.


“The Physician” (Alemanha, 2013), escrito por Jan Berger, dirigido por Philipp Stölzl, com Tom Payne, Stellan Skarsgård, Ben Kingsley, Emma Rigby, Olivier Martinez, Elyas M’Barek, Stanley Townsend, Fahri Yardim, Adam Thomas Wright, Jodie McNee e Dominique Moore.


Trailer de O Físico

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5 Comentários. Deixe novo

  • Luiz Felipe
    29/05/2017 16:57

    Eu goste do filme … funciona como uma descrição ilustrativa da realidade na Idade Média – tanto em Londres como na Pérsia. Recomendo !!!

  • Ricardo Palumbo Oliveira
    15/02/2017 15:44

    Apenas uma correção à crítica é que a Igreja Católica nunca acreditou na reencarnação, mas sim numa única encarnação, e depois da morte a ressureição para a vida eterna.
    Quanto ao filme, gostei muito e recomendo.

  • Ana Carla
    10/09/2016 3:19

    Gostei do filme!

  • Os médicos da Idade Médica eram chamados de “físicos” — e o título do filme segue o título do livro em português.

  • Antonio Carlos
    21/05/2016 1:30

    A tradução de “physician” é simplesmente “médico”, e não “físico”.

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