Minha Lua de Mel Polonesa | Em busca do passado

[dropcap]I[/dropcap]magine que coisa louca: o que você chama de “você” é a soma das ações dos seus antepassados, uma criação cultural e social (e religiosa) que culminou em sua existência. E quando olhamos para trás é bom saber o que houve no passado, não? Dá uma sensação de identidade, pertencimento, ou pelo menos uma explicação da razão de sermos do jeito que somos. Agora, e se não soubéssemos nada desse passado? Angustiante, talvez? Minha Lua de Mel Polonesa é um filme que explora um pouco dessa possível angústia do que é não saber sobre suas origens, em uma comédia leve, bem-humorada e… com alguns tiques nervosos.

Sua protagonista é Anna (Judith Chemla), uma francesa cuja avó era uma judia polonesa que teve um passado conturbado graças ao sentimento antissemita de sua época. Disposta a viajar para a terra natal de sua avó em uma espécie de lua de mel com seu marido para um evento em memória dos judeus exterminados, Anna insiste em “se sentir polonesa” a todo custo, ainda que ela não tenha nenhuma pista do que é isso através de sua mãe, que nunca compartilhou nada a respeito.

Estreia da atriz Élise Otzenberger na direção e roteiro, Minha Lua de Mel… é uma comédia de situação bem convencional, que une as experiências que temos quando viajamos para uma terra estrangeira, como pedir pela reserva do quarto do hotel ou entrar em uma loja sem ter a mínima ideia de como vai se comunicar com as pessoas, isso aliado ao jeito desajeitado e desesperado de sua protagonista em conseguir respostas. Seu tour pela Polônia, seja lá qual for a cidade, é simplista e baseado em pouquíssimos cenários. Talvez de baixo orçamento, Anna olha para o fundo e diz como tudo é lindo, mas nós, espectadores, não vemos nada. Só frio, chuva e um céu nublado.

A maioria dos momentos de fazer rir funcionam, mas Anna se torna a caricatura de uma mulher histérica, e sua jornada acaba perdendo a importância desde o começo, quando a vemos descrevendo de maneira neurótica uma lista detalhada do que deve ser feito pelos pais com seu filho pequeno em sua ausência, usando o agora clichê das “verduras orgânicas que a mamãe deixou na geladeira”. Repare nisso: toda mãe jovem em uma comédia irá falar para uma geração mais antiga sobre as verduras orgânicas que separou para seu filho, e isso automaticamente a rotula como chata, pedante ou alguma característica negativa. Além disso, Anna se comporta muito mal em vários lugares diferentes, como ao beber quase uma garrafa de vodca inteiro em um restaurante, sem mostrar para nós, espectadores, a razão disso estar acontecendo.

Para piorar, essa estereotipagem de Anna acaba ficando mais destacado ainda em comparação com os outros personagens. Enquanto Judith Chemla está sempre se comportando de maneira errante e agitada, berrando sempre que possível e incomodada eternamente com o fato de não saber nada sobre o passado de sua família, tanto o marido quanto a mãe, interpretados por Arthur Igual e Isabelle Candelier, estão praticamente alheios à sua necessidade, totalmente relaxados e se comportando como se Anna nunca tivesse dado a entender que acha descobrir sobre seu passado importante.

O resultado é que as interações entre essas pessoas soam artificiais e maniqueístas, feitas para rirmos do contraste. E quando surge aquele momento das pessoas se acertarem que todos esperamos, é tarde demais: já estamos incomodados com Anna, a “histérica”.

As melhores partes do filme acabam sendo sobre a exploração de dois viajantes de uma terra estranha, com suas idiossincrasias que são fáceis de se identificar por todo mundo que já reparou nas diferenças culturais em suas viagens. Como tours guiados pelos cenários da tragédia do Holocausto ou as tentativas desajeitadas de interagir com os locais. Como uma lojista que acaba servindo chá para eles ao ouvir a palavra “Kaput”, que em alemão significa quebrado, inútil, mas a diversão é tentar entender o que aconteceu no indecifrável idioma polonês.

Por todas essas partes boas Minha Lua de Mel Polonesa acaba se saindo melhor que o esperado. É possível curtir de maneira leve essa comédia de costumes sobre sentimentos de inadequação ou arrependimento de fazer parte de certa etnia ou cultura, mesmo sem mostrar exatamente o que é essa cultura. Como muitos filmes sobre judeus, incluindo os de Woody Allen, as piadas são internas, mas eventualmente conseguimos dar risada de como é estranho que hoje ser judeu possa ser uma ofensa e um incômodo.


“Lune de Miel” (Fra, 2018), escrito por Mathias Gavarry e Élise Otzenberger, dirigido por Élise Otzenberger, com Judith Chemla, Arthur Igual e Brigitte Roüan.


Trailer – Minha Lua de Mel Polonesa

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