Mato sem Cachorro

Fazer uma comédia romântica dar certo não é tão complicado assim, talvez, junto com os slashers, sejam até os gêneros mais fáceis de agradar seus fãs fazendo pouco. Mato sem Cachorro então acaba sendo uma tentativa sincera de fazer uma comédia romântica Mato sem Cachorrodescartável (no bom sentido). Uma tentativa que parece ter toda a consciência do mundo de que seria preciso pouco para conquistar suas plateias. Infelizmente, pouco mesmo.

Portanto, se o primeiro filme de Pedro Amorim não encanta o tanto quanto parece que vai fazer, tampouco gera muitos problemas para quem entrar no cinema apenas para ver uma bonitinha história de amor, permeada por uma situação (bem criativa) envolvendo um cachorro simpático e um desfile de situações que se esforçam bastante para serem engraçados. Isso vem então com um problema que mais parece reflexo de pressa na hora de colar tudo.

O incrível disso é que, logo de cara, é impossível encontrar qualquer um desses escorregões nesse primeiro momento enquanto Mato sem Cachorro começa a contar a história desse cara chamado Deco (o bem à vontade Bruno Gagliasso), dessa moça Zoé (a ótima Leandra Leal) e Guto, um cachorro com “narcolepsia”, doença que faz com que ele caia no sono toda vez que fica emocionado. É exatamente o cachorro que une os dois, mas em um namoro que termina depois de um tempo e faz com que Deco acabe tendo a ideia de sequestrar o cachorro em um momento de raiva ao vê-la (Zoé) com um novo namorado.

Um ponto de partida que realmente tinha tudo para dar certo, e dá. Começa ágil, engraçado, cheio de personagens divertidos e situações que podem vir a dar certo, até que se enterra em um segundo ato arrastado, principalmente por não conseguir manter o mesmo ritmo. É realmente interessante como o que parece uma simples narração na abertura do filme (que faz muito bem ao bonito trabalho de Amorim nesse primeiro momento) se transforma em um programa de rádio, mas assim que surge o primeiro palavrão (que é um “porra”, mas como esse é um site de família é melhor não ficar falando ele!) o que vem na sequência é muito mais “porra” do que filme. Sem perceber que depois do primeiro, a piada simplesmente para de funcionar (pior ainda quando chega perto do quinquagésimo).

E não um simples falso moralismo falando mais alto, mas sim a constatação de que o filme merecia muito mais que isso, ainda mais quando o mesmo subterfúgio é usado com uma ponta (engraçada, mas que soa descartável dentro da trama do filme) de Gabriella Duarte. Enquanto é engraçado ver a atriz global desconcertantemente mal educada, beira a irritação ter que aguentar o comediante Danilo Gentili, apenas sendo ele mesmo enquanto acaba cada frase com um palavrão. Falta a ironia da situação nele e sobra (e funciona) nela.

Como se o roteiro de André Pereira (que também faz seu primeiro trabalho no cinema) não soubesse equilibrar uma série de momentos que poderiam ser sutilmente engraçados com aqueles que, realmente, embalam o filme e a história (como uma boa e velha comédia romântica). Ao invés de apenas um diálogo, a ideia parece sempre ser acaba-lo com mais uma “porra”.

Mato sem Cachorro Filme

O pior de tudo é que, talvez, esses momentos desnecessariamente desbocados acabam impedindo que algumas boas ideias tenham mais espaço, como a maioria dos momentos narcolépticos do cão, a presença de um anão e um divertido arco envolvendo a Sandy (aquela do Júnior) vomitando. Três exemplos que parecem piores que um monte de palavrões, mas, com certeza ditariam o clima do filme e seu humor, ainda que muito menos politicamente correto, mas que caberia (cabem, na verdade) perfeitamente na ideia geral.

E voltando ao cansaço, é muito provável que, mesmo sem qualquer “porra”, ainda assim, Mato sem Cachorro derrapasse em seu ritmo no segundo ato, se atrapalhando na hora de cruzar os caminhos de todos os personagens, como quando obriga o espectador a conviver com um arco envolvendo o irmão de Zoé, que surge do nada e se torna importante demais no final, soando em seu todo até mal desenvolvido. Falta uma introdução, uma apresentação e, no final das contas, uma disputa entre bandas que envolvesse mais que apenas uma banda, coisa que não convence nem o espectador mais envolvido com a história.

Um segundo momento que é todo permeado por uma divertida discussão entre Deco e seu primo (Gentili) sobre o desenho animado A Caverna do Dragão (e ultrapassar o portal ao invés de voltar para o “viadinho” do unicórnio), mas em uma conversa que surge do mais absoluto nada, como se tivesse sido introduzida depois de algum detalhe, ou pior ainda, sido vítima de uma montagem que surge como um dos grandes tropeços do filme. Um trabalho que corta piadas e deixa referências (como no momento em que alguém diz “não fazer mais esse tipo de trabalho”… esse qual?) e escorrega em momentos mais bacanas ainda, como não deixa a divertida música sobre o sequestro do cachorro ser tocada o suficiente para ser reconhecida pelo espectador em um segundo momento e ainda priva todos de uma inventiva passagem de tempo pontuada por uma empresa de mudanças com um nome bem característico.

E o interessante disso tudo é que, ainda assim Mato sem Cachorro, diverte mais do que irrita, mostrando que, seria necessário muito pouco para que o estreante Pedro Amorim (que em certos momentos ainda tem pequeno problema com pontos de fuga e com “sua” proximidade da ação) fosse uma ótima comédia romântica ao invés apenas mais uma.


Idem (Bra, 2013), escrito por André Pereira, dirigido por Pedro Amorim, com Bruno Gagliasso, Leandra Leal, Danilo Gentili, Enrique Diaz e Letícia Isnard


Trailer do filme Mato sem Cachorro

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