Mães de Verdade | Um amor, vários pontos de vista


Não existe mistério em Mães de Verdade, novo filme de Naomi Kawase, mesma cineasta de Sabor da Vida e O Segredo das Águas. Um filme sobre os diferentes amores das diferentes mães em uma situação única. O que muda é o ponto de vista.

O filme é sobre o amor, mas também é sobre a construção desse sentimento. E o que pode parecer pouco natural, dito assim desse jeito frio, é na verdade um desfile sensorial. Do choro do bebê no nascimento, até o reconhecimento, mesmo que esses dois momentos não sejam necessariamente tão próximos como deveriam, mas com certeza são sinceros.

O grande acerto do roteiro escrito pela própria Kawase em parceria com Izumi Takahashi é não desvendar esse mistério do distanciamento sem antes tentar entender o significado desse amor de mãe. Lado por lado, situação por situação, pessoa por pessoa. Um filme humano sobre questionamentos inerentes e situações que qualquer mulher poderia passar.

Essa história começa acompanhando os pais desse pequeno garoto e um problema na escola que os leva a tentar entender um pouco de como eles chegaram ali naquele momento. Do amor dos dois até as decisões que tiraram de suas vidas a possibilidade de um filho natural, o que os leva a uma empresa de adoção.

Os conflitos e opções desses dois personagens são genuínos, não criam uma trama melodramática, mas sim uma história humana. Kawase opta ainda por, sutilmente, construir essa dinâmica onde essa sociedade japonesa oprime os desejos dessa mãe, ainda que nesse ponto exista apenas o desejo da maternidade. Uma opção que só vira realidade diante da vontade do pai. Mães de Verdade não se prende à crítica, apenas aceita essa perspectiva e a usa para compor sua história.

O desenrolar dela nunca tem pretensão de construir um mistério, mas sim de expandir os pontos de vista dentro de uma mesma história. Após o surgimento da mão biológica no presente, agindo de forma inesperada, o espectador é convidado a tentar entender aquela outra verdade. Aquele outro amor de mãe.

Prefere não encarar a mãe biológica de frente antes de colocar o filme no rumo de suas opções. É preciso entender aquela garota antes de poder simplesmente julgá-la. É isso que Mães de Verdade mais quer: entender aquelas pessoas, não as julgar.

A trama então corre ao redor dessa jovem garota, seus desejos, sonhos, amores e opções diante da gravidez, ainda que nenhuma delas seja viver sua vida. Não existe certo ou errado, mas sim caminhos distintos que acabam se cruzando diante, não das suas alternativas, mas das poucas possibilidades que lhes são dadas.

Em um terceiro momento, um terceiro ponto de vista. Ainda que mais curto e mais sutil, a câmera de Kawase busca o jovem filho, cheio de descobertas, uma luz que toma a tela e uma impressão de que tudo pode ser belo e surpreendente.

Tudo converge para um mesmo ponto. Um lugar onde essas duas mulheres têm, pela primeira vez, a oportunidade de decidirem seus destinos e as opções que o filho terá. E isso é o reflexo daquele olhar apaixonado de uma mãe por seu filho enquanto ele escova os dentes, ou até apenas naquele recado que servirá de única ligação. O amor dessas mães por esse filho é o que move Mães de Verdade para essa experiência sensível e verdadeira sobre um amor puro, sem barreiras, imposições e com um futuro todo à sua frente.


“Asa ga Kuru” (Jap, 2020); escrito por Naomi Kawase e Izumi Takahashi, a partir do livro de Mizuki Tsujimura; dirigido por Naomi Kawase; com Myoko Asada, Arata Lura, Ren Komai, Aju Makita, Hiromi Nagasaku e Hiroki Nakajima


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