Linda de Morrer Filme

Linda de Morrer

Comédia com pretensões de levantar também uma discussão sobre a indústria da beleza, Linda de Morrer prefere investir apenas no humor escrachado e em piadas tolas – e mesmo ofensivas -, prejudicando seus momentos mais sérios e emocionais. O resultado é uma bagunça que falha em todos os seus objetivos.

Paula (Glória Pires) é uma renomada dermatologista que acaba de inventar uma pílula que elimina totalmente a celulite – uma droga aparentemente milagrosa sem contra-indicações e efeitos colaterais e que não vicia. É claro que a realidade não é tão maravilhosa e, na noite de lançamento do produto, os efeitos colaterais da pílula começam a atacar Paula que, passando mal, cai da escada e morre. Seu espírito, porém, não pode partir para “o outro lado” até que a médica resolva suas pendências: revelar ao mundo a realidade sobre a droga que criou e consertar o relacionamento com a filha, Alice (Antonia Morais). Para isso, Paula conta com a ajuda da falecida Lina (Susana Vieira), praticamente do candomblé que transmitiu seus dons de falar com os mortos para o neto, o psicólogo frustrado Daniel (Emilio Dantas).

A falta de foco de Linda de Morrer é exemplificada no fato de que, mesmo que a vida após a morte e o contato com os mortos sejam a base da trama, o candomblé é tratado como piada durante o ritual que acompanhamos. As tradições da religião são retratados de forma caricata sem necessidade nenhuma e, considerando a importância dela para a história aqui contada, isso se mostra desrespeitoso – e ineficiente, já que elimina o peso dramático da situação.

Afinal, o diretor Cris D’amato e os roteiristas Carolina Castro, Jô Abdu e Marcelo Saback tentam mesclar a comédia com drama familiar e comentário social, mas se esquecem de investir nos dois últimos itens em favor apenas de piadas tolas e óbvias. Se o fracasso profissional de Daniel poderia acrescentar algo interessante em seu arco quando ele começa a ter contato com os mortos, o longa prefere mostrá-lo diversas vezes gritando com espíritos enquanto as pessoas a seu redor o acham maluco ou que ele está sendo grosso com elas.

Da mesma forma, o roteiro investe no batido conflito entre “mãe que trabalha demais” e “filha deixada de lado que é contra os valores da mãe” e, por mais que Paula se esforce para consertar a relação das duas, obviamente, já é tarde demais para isso – portanto, o que realmente acontece é que Paula, após a morte, limpa sua imagem com a jovem. Mesmo assim, a fotografia de Alice rende o momento dramático mais eficiente do filme: através de belas imagens de mulheres performando atividades rotineiras (incluindo várias fotos de Paula), ela busca retratar a beleza real da mulher, afastada das imposições impossíveis da indústria de beleza.

E, mesmo que a narrativa mostre que é saudável e divertido gostar de estar bonita e de se arrumar – exemplificado quando Paula reencontra seus sapatos de salto -, Linda de Morrer mais uma vez abandona quaisquer pretensões de aprofundar a discussão quando Paula invade o corpo Francis (Angelo Paes Leme) e, ao invés de manter o foco no discurso da protagonista, D’amato prefere dar destaque para o fato de que Francis está agindo de forma efeminada. Porque ele foi possuído pelo espírito de uma mulher. E espíritos femininos, quando invadem o corpo de um homem, agem de forma mais efeminada do que jamais agiram em seus próprios corpos. Apenas para ninguém esquecer de que, naquele momento, tem uma mulher dentro daquele corpo. E para tornar essa tirada ainda mais engraçada (leia-se: ofensiva), há diversas piadas envolvendo a homossexualidade de Marcelo (Pablo Sanábio), comparsa de Francis.

Linda de Morrer Crítica

Como ofender a base de sua trama e uma única minoria não é o bastante, o longa ainda faz questão de trazer os dois únicos personagens negros que ganham algum destaque como empregados de Paula e, enquanto todas as outras clientes que consumiram a droga milagrosa são tomadas por um surto de raiva como reação, Jaci (Priscila Marinho) sente uma vontade incontrolável de fazer faxina, fica com tesão e dança funk. O que é uma pena, pois estraga a sequência mais engraçada do filme: uma apresentadora de um programa estilo Mais Você surta em frente às câmeras enquanto um jovem cantor, apavorado, tenta manter a compostura.

Além disso, a trama depende inteiramente do fato de que foi possível esconder os graves efeitos colaterais do comprimido – o que parece absurdo, ainda mais considerando a rapidez com que eles aparecem. Por se tratar de uma comédia, o “furo” até poderia passar (as pernas das cobaias, afinal, também surgem impossivelmente lisas) mas, novamente esquecendo seus objetivos, o roteiro tenta soltar explicações e criar suspense no terceiro ato.

Glória Pires consegue divertir ocasionalmente com o jeito objetivo e sem noção de sua personagem – seu primeiro comentário quando descobre que morreu é que ela está vestida de forma adequada à ocasião -, mas não é o bastante para resgatar o longa da mediocridade. Sem alcançar seus objetivos de fazer rir ou de fazer pensar e sem saber quando investir em cada um de seus objetivos, Linda de Morrer consegue apenas se estabelecer como uma produção sem identidade.


Linda de Morrer” (Bra, 2015), escrito por Jô Abdu e Carolina Castro, dirigido por Cris D´amato, com Emilio Dantas, Angelo Paes Leme, Susana Vieira, Glíoria Pires e Viviane Pasmanter.


Trailer do filme Linda de Morrer

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