Life Itself

Life Itself

É uma pena que Life itself acabe chegando ao Netflix sem o menor alvoroço, propaganda ou boca-a-boca. “Uma pena” não só por ser um documentário incrível sobre uma figura mais incrível ainda, mas também por demonstrar o quanto as distribuidoras no Brasil não parecem inspiradas o suficiente para se aventurarem em um material que soa desconhecido.

Soa assim já que o Brasil não tem um passado de consumo de crítica de cinema de modo tão enraizado na cultura pop como em certas partes do mundo, o que não permite desfrutar do fenômeno midiático que existe por trás de Roger Ebert e de seu nome, tanto nos Estados Unidos, como em boa parte do mundo. De qualquer jeito, lançar essa verdadeira homenagem a esse que muito provavelmente seja o maior crítico de cinema que o mundo já viu, talvez fosse um enorme presente para os amantes de cinema daqui.

E não tenha dúvida, qualquer (verdadeiro) amante de cinema, seja no Brasil ou no mais longínquo território que você estiver pensando nesse momento não só conhece Roger Ebert, como vê nele uma figura importante para a mesma sétima arte que ele tanto amou. E se não o vê assim, deveria.

Mesmo que então o documentário seja o resultado de um esforço de Steve James para colocar na tela quem era Roger Ebert, mais que isso, seu filme é uma declaração de amor. James, que não só foi indicado ao Oscar em 1994 por seu filme Hoop Dreams, como desde antes disso viu o mesmo Ebert rasgar elogios em todo lugar que fosse, por seu documentário sobre esse grupo de jovens de Chicago e seus sonhos de ganharem a vida como jogadores profissionais. James acabou então se tornando um amigo de Ebert, e a partir disso teve a honra de eternizar no cinema sua vida. O que vem bem a calhar.

Para sorte do diretor, e consequentemente do próprio espectador, James não só teve a oportunidade de conviver com Ebert em seus últimos dias (ou em seu “terceiro ato”, como aponta em certo momento), como têm em mãos um vasto material tanto em termos de videos, quanto fotos e entrevistas. Além disso, James não só vai em busca do título do livro escrito por Ebert para batizar o filme, como tira dele grande parte das narrações. Uma decisão mais que adequada, já que foram através de seus dedos que o crítico pôde continuar “falando”.

Life Itself Crítica

Ebert morreu em abril de 2013 em decorrência de uma pneumonia que, muito provavelmente, vinha diante do enfraquecimento de um tratamento extenuante no qual ele combatia um câncer que teve início em sua tireoide e que ao se alastrar por sua mandíbula resultou em um impedimento de comer, beber e falar. A doença teve seu ápice em 2006, e a decisão de Ebert foi continuar seu trabalho, e aumentar mais ainda seu legado através de seus textos. Dali em diante, não só suas críticas se tornaram sua voz, mas seus textos em seu blog o permitiram continuar a ser quem sempre foi: Uma fonte de inspiração.

Life Itself então não desvia o olhar para esse momento delicado e quase chocante onde Ebert parece fragilizado entranhado em uma cama, mas também não permite que em nenhum momento isso seja seu foco principal. Ainda que apenas isso baste para que muita gente chore baldes de lágrimas, James, na maioria do tempo, foca seus esforço estéticos em olhar para esse homem, mas enxergar nele a força e o “coração de ferro” que sua esposa diz ter descoberto ao vê-lo lutando contra a doença.

James então prefere intercalar isso com a ambição de traçar um retrato maior sobre o Roger Ebert público. Aquele que começou a escrever com quinze anos, era um editor rígido no jornal da faculdade e, quase sem querer, acabou ficando com a responsabilidade de escrever sobre cinema no Chicado Sun-Times. O diretor então não foge dos assuntos mais ásperos, e não esconde o Roger Ebert que sofreu com alcoolismo, ou até que por muito era visto não como “a melhor pessoa do mundo”. E essa tridimensionalidade que mais faz com que o espectador se apaixona ainda mais pelo personagem central dessa história, principalmente por ele ter defeitos a agruras como cada um de nós.

E por mais que em certos momentos se deixe levar por uma sessão “amigos de muitos anos falando bem”, no resto do tempo a impressão que fica é de um mosaico com o único objetivo de criar a imagem desse homem. Dessa pessoa com um paixão tão grande pelo cinema que o permite que ela se confunda com seu caminho. Desse legado que ainda influenciará gerações. Desse crítico. Dessa lenda.


“Life Itself” (EUA, 2014), escrito e dirigido por Steve James


Trailer – Life Itself

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