Footloose

Em 1984 não só o mundo era outro como o cinema, mais ainda, vivia em uma época completamente diferente, que não só ainda sobrevivia de uma década anterior cheia de personalidade, como parecia começar a descobrir todas as possibilidades e aberturas que uma boa bilheteria poderia resultar. No meio disso tudo, dançar até não poder mais, com um pop/rock ao fundo, soou como novidade (a época dos musicais já tinha sido “esquecida”), ainda mais quando um esforço mínimo permitia que o filme tivesse uma história para contar. Em 1984 Footloose fez isso, hoje sua refilmagem não passa nem perto disso.

E antes de qualquer coisa, não existe nem ao menos a desculpa de querer trazer toda a trama em direção aos dias atuais, já que, de modo medíocre e completamente vazio, Dean Pitchford volta para escrever o roteiro (ele foi responsável pelo primeiro) em parceria com Craig Brewer, que também dirige o remake. Estabanadamente, o que a dupla faz é, justamente, copiar o original de cabo a rabo, mudando apenas certos pontos na estrutura que, ironicamente, faziam o filme não ser uma experiência frustrante e artificial.

Por mais que lá atrás a ideia nunca deixasse de ser colocar Kevin Bacon para dançar enquanto contava essa história sobre uma cidade que proibia qualquer tipo de dança (e Rock´n Roll), era a construção interessante dessa história que mais funcionava, em como o espectador era colocado para encarar tudo pela ótica do protagonista, e não o contrário. De modo completamente equivocado Brewer permite que os clássicos pés dançantes dos créditos iniciais de 1984 caiam agora na armadilha de se encaixarem em um mundo real. E no mundo real ninguém dança em um galpão abandonado.

Nessa Bolmonte onde não se pode dançar, nem escutar música alta, o novo espectador vai, antes de qualquer coisa, se deparar com pessoas dançando, enchendo a cara de bebidas e… digamos assim, morrendo. E não importa se o filme precisa esfregar em sua cara a elipse de “três anos depois” por meio de uma legenda, do lado de cá da tela, se passaram apenas 30 segundos.

De modo equivocado, Brewer e Pitchford resolvem apresentar, somente depois disso tudo, seu protagonista (Kenny Worland), descendo de um ônibus com banca de anti-herói e conseguindo ser um pior Kevin Bacon do que o próprio conseguiu ser em toda sua carreira (e olha que isso é bem difícil, principalmente nos anos 80 e 90). O resultado disso: por qualquer rumo que o filme tome depois, todos já sabem que dançar (ou se esfregar) com o sexo oposto, tomar cerveja até ela escorrer para fora do copo e beijar a namorada resultam em morte.

E se tanto no parágrafo anterior quanto no anterior a ele essa crítica chega à mesma conclusão, é apenas para deixar claro o quanto acaba sendo irritante escutar essa mesma história duas vezes durante o novo filme, sendo que na segunda vez, onde ela deveria acontecer de verdade e mudar o rumo de seus personagens, ela acaba completamente desperdiçada, morrendo ela própria em cima daquela ponte.

Voltando então um pouco antes no texto, há ainda um segundo problema grave que carrega mais ainda esse “Footloose” para um buraco escuro das refilmagens que não deram absolutamente nada certo (como Psicose, Rollerball e tantos outros), o de acabar com quer possibilidade de o espectador encarar aquilo como um musical. Enquanto no original os pés dançando sobre um fundo neutro convidavam todos no cinema para um pouco de fantasia e diversão, aqui, os mesmo pés terem donos faz com que o espectador acorde e veja esse monte de adolescentes se esfregando no estacionamento de uma lanchonete enquanto dançam (além de uma “dança em linha”, country, se transformando em quase um baile funk sexy) mais pareçam selvagens de alguma tribo esquecida que se sociabilizam através de dança, assim como resolvem suas depressões pulando em um galpão esquecido. E nesse último caso (no galpão) tudo piora ainda quando o diretor decide deixar tudo “mais real” com o protagonista até errando alguns passos, em outras palavras: deixando mais real um número de dança que deveria ser quase encarado como um pedaço de fantasia.

E isso ainda ajuda o espectador a ter que encarar motivações como tentar acabar com a lei contra a dança só para “fazer a diferença e não desaparecer dentro da multidão”, o que, em termos de realidade, se torna uma desculpa completamente egoísta e sem fundamento. Mesmo que isso venha de uma personagem que chega em uma cidade, faça uma lata-velha funcionar, seja multado, vá a igreja no dia seguinte (de terno) e só então, dois dias depois, comece a desarrumar sua mala.

Esquecer então que todos seus personagens estão em um limbo entre realidade e fantasia musical permite que o mesmo protagonista vá a escola fantasiado de estrela de filme adolescente dos anos 80 (ou simplesmente de Kevin Bacon) ou que seu antagonista suba em um trator para mostrar o quanto é mau e ande vinte metros com ele antes de esquecer a enorme máquina de lado e subir em um ônibus para disputar uma corrida.

Porém, quem sai ganhando em todo esse desastre é Denis Quaid, que acaba fazendo um trabalho igualmente ruim como vem fazendo em seus últimos filmes, mas pelo menos dessa vez contracenando com um elenco tão nulo que pouco lhe atrapalha.

Mas Footloose acaba sendo uma experiência divertida, senão para seu público, pelo menos para o personagem vivido por L. Warren Young, dono da fabrica onde o protagonista trabalha, que, durante todo tempo fica de espectador VIP desses “branquelos rednecks” discutindo e não avisa nada para ninguém que para dançarem, beberem e se esfregarem só precisavam mesmo era atravessar uma rua.


Footloose(EUA, 2011) escrito por Dean Pitchford e Craig Brewer, dirigido por Craig Brewer, com Kenny Wormald, Julianne Hough, Dennis Quaid, Andie MacDowell, Miler Teller, Ray McKinnon e Kim Dickens.


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