A Entrevista Filme

A Entrevista

A Entrevista é uma comédia meia-boca com um humor infantil e repetitivo que, por retratar um plano para assassinar o ditador da Coreia do Norte, Kim Jong-un, tornou-se algo maior, gerando um A Entrevista Posterescândalo dentro da Sony Pictures e até mesmo o cancelamento do lançamento do filme, agora disponível para compra digital. Deixando de lado as polêmicas, o que resta é um longa-metragem descartável e longe de se tornar uma comédia cult.

Dave Skylark (James Franco) é apresentador de um popular programa de entrevistas. Porém, seu produtor, Aaron Rapaport (Seth Rogen), começa a desejar trabalhar em algo mais sério, em “jornalismo de verdade”. A oportunidade surge quando Dave descobre que Kim Jong-un é fã do programa, e os dois conseguem marcar uma entrevista com o presidente coreano. Antes de a dupla partir para Pyongyang, porém, a CIA resolve aproveitar a rara oportunidade de ter um norte-americano dentro do país para colocar em prática um plano de assassinar o ditador.

Retratando a Coreia do Norte como um povo que detesta os norte-americanos e que idolatra Jong-un de tal forma a ponto de acreditar que o presidente fala com golfinhos e não tem necessidades fisiológicas como um ser humano comum, A Entrevista exagera no tratamento a uma população oprimida, mas acerta ao mostrar o patriotismo exagerado dos Estados Unidos e seu histórico de decisões estúpidas (“Quantas vezes os Estados Unidos podem repetir o mesmo erro?”, pergunta a assessora vivida por Diana Bang; “Quantas vezes for necessário!”, responde Dave). Isso, porém, não impede Rogen e Dan Sterling, que assinam o roteiro, de recorrer a piadas racistas que poderiam ter saído da mente de um moleque de 13 anos, como fazer graça do sotaque coreano.

O que causou toda a polêmica, porém, foi incluir uma tentativa de assassinar Jong-un. O homem é um ditador, repetindo e multiplicando os erros de seu pai e mantendo seu povo na miséria; não é alguém que merece respeito. O mesmo, obviamente, não pode ser dito do povo norte-coreano, que vive sob uma terrível ditadura e à mercê de Jong-un. E, aliás, os Estados Unidos são, realmente, um país estranhamente patriótico, em que muitos habitantes se enfurecerem com a imagem da bandeira nacional em chamas. Como seria a reação deles se um país comunista de terceiro mundo (supondo que fosse um filme que tivesse tanta divulgação ou contasse com nomes tão conhecidos quanto A Entrevista) realizasse uma obra que trouxesse uma tentativa de matar o atual presidente norte-americano? Comparar Jong-un a Hitler não funciona, pois distanciamento histórico é algo que deve ser considerado – uma história ficcional trazendo o assassinato do líder nazista jamais existiria quando ele estava no poder.

Isso, porém, é um assunto que rende longas discussões, diferentes argumentos – dois dois lados – e diversas opiniões e, mesmo reconhecendo seu impacto no mundo real, o filme ainda deve ser analisado de forma isolada. Até porque, em alguns meses, a situação será esquecida, pois A Entrevista não é um filme que permanecerá por muito tempo na cabeça dos espectadores, mesmo levando em conta a polêmica que originou.

Como sátira política, os realizadores (Rogen também dirige ao lado de Evan Goldberg) acertam na construção de Jong-un como personagem, mérito também do eficiente Randall Park. Retratado aqui como um homem que vive à sombra do pai e que esconde seus sentimentos e fraquezas para manter a imagem divina para seu povo, Jong-un começa a se revelar aos poucos ao formar uma amizade com Dave que, claro, serve principalmente para ganhar a confiança do apresentador e, assim, vender a imagem da Coreia do Norte como país próspero e justo. Mesmo assim, a impressão é a de que o antagonista e o cenário foram escolhidos apenas por serem um “alvo fácil”, já que não há realmente um objetivo em ambientar a trama na Coreia do Norte – o destino do país, ao final do filme, sequer é revelado ao espectador, pois pouco importa aos realizadores agora que seus protagonistas não estão mais lá.

A Entrevista Crítica

O longa, afinal, não se leva muito a sério, e não tem realmente pretensões de ser uma grande crítica ao governo norte-coreano – é apenas mais uma comédia de Seth Rogen, apenas ambientada em outro continente. E se isso transforma o filme em algo não totalmente medíocre – já que, se tivesse essas pretensões, elas seriam frustradas -, a questão é que, como comédia, A Entrevista continua sendo descartável, mesmo se comparada a filmes anteriores do próprio Rogen. Quem estiver em busca de uma comédia que não se leve a sério e faça humor consigo mesma terá mais sucesso assistindo a Anjos da Lei e sua continuação, para citar um lançamento recente.

O senso de humor do filme é adequado a um pré-adolescente: são inúmeras as piadas sobre excrementos, sexo anal, ereções e homens heterossexuais falando sobre homossexualidade – seja o bromance entre Dave e Aaron / entre Dave e Jong-un ou a abertura completamente estúpida em que Eminem (rapper cujas letras são repletas de discursos homofóbicos) revela ser gay (algo que, se acontecesse de verdade, estaria longe de ser “a coisa mais importante que já aconteceu na história gay”, como clama Aaron). Além disso, apesar de trazer duas personagens femininas de destaque e que são profissionais competentes e em posições de autoridade – Lacey, agente da CIA interpretada por Lizzy Caplan, e Sook, assessora de Jong-un vivida por Diana Bang -, as duas recebem uma quantidade exagerada de comentários sobre sua aparência e, mesmo que Lacey rebata as sugestões dos protagonistas, muito acertadamente apontando a misoginia de eles acharem que a única função que ela possivelmente poderia ter, por ser uma mulher atraente, é a de atrair e distrair homens, ela ainda é sexualidade pela câmera durante o simples ato de tirar o blazer.

Enquanto James Franco faz uma performance moderadamente divertida, convencendo como um homem ignorante que vez ou outra é capaz de uma ideia inspirada (apesar das irritantes referências a O Senhor dos Aneis e a uma música da Katy Perry que, mais uma vez, mostram a repetitividade do senso de humor do filme), Seth Rogen, que nunca foi um ator muito inspirado, surge ainda menos carismático do que o normal. E, ao contrário de Dave, Aaron é um personagem que parece fazer o que quer que o roteiro necessite que ele faça, já que, por exemplo, sua insatisfação com o tipo de trabalho que surge apenas quando um produtor de “60 Minutes” afirma que aquele sim é um programa que traz “notícias de verdade”.

A Entrevista é, portanto, um filme que acerta ocasionalmente mas que, como um todo, falha tanto como comentário político quanto como comédia. Trazendo piadas imaturas e repetitivas, a polêmica que causou é mais interessante do que a obra em si, que dentro de alguns meses terá sido esquecida – enquanto Rogen e comediantes como ele continuaram contando a mesma história através de outras tramas.


“The Interview” (EUA, 2014), escrito por Dan Sterling, Seth Rogen e Evan Goldberg, dirigido por Evan Goldberg e Seth Rogen, com James Franco, Seth Rogen, Lizzy Caplan, Randall Park, Diana Bang e Timothy Simons


Trailer – A Entrevista

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