Jornada nas Estrelas IV – A Volta para a Casa

O ano era 1986 e a franquia Jornada Nas Estrelas já tinha se tornado a maior marca da Paramount, tanto em termos de bilheterias quanto em marketing (fora todo culto aos seus personagens e universo). Fatores que então nem obrigariam o quarto filme da série a jornada-nas-estrelas-IVser algo diferente, ou que pelo menos ainda não tivesse sido usado nos filmes anteriores, era só ter um algarismo romano ao lado que já era certeza de sucesso.

Mas uma inquietação e uma vontade de fazer algo novo não permitiram que a mesmice atacasse esse próximo filme, era preciso algo novo. E se você pensou em viagem no tempo, que é o cerne de Jornada nas Estrelas IV – A Volta Para Casa”, errou, na verdade a ideia era outra, algo mais perto de “porcaria”.

Em nenhum dos outros três momentos que a tripulação original da série de TV ganhou os cinemas o resultado chegara a algo perto de tamanho desastre. Tanto em termos narrativos, quanto estéticos, técnicos e, muito provavelmente, no coração dos fãs.

Um sinal de que, certamente, aquilo tudo poderia estar indo longe demais naquela história de “onde homem nenhum jamais chegou”, já que seria muito mais interessante ter ficado por lá, na “fronteira final”, ao invés de voltar até o século XX para entregar panfletos contra a extinção das coitadas das baleis cachalotes, que, muito provavelmente, nunca foram tão mal usadas na história do cinema.

Mas afinal, por que salvá-las?

Enfim, Spock tinha sido encontrado e a tripulação clássica estava completa mais uma vez (Uhura tinha ficado em algum lugar na Terra, mas pegou alguma carona e chegou a Vulcano). Mais precisamente, três meses se passaram, e agora era hora de voltar para casa, já que tinham arrumado a Ave de Rapina dos Klingons (a Enterprise tinha sido destruída no último filme) e precisavam dar algum tipo de satisfação para a Federação depois de roubarem sua nave e partirem para o espaço (coitada da Uhura, que ficou para “pagar o pato”).

Enquanto isso, corta para um Klingon pedindo a cabeça do “vilão” Capitão Kirk, que atacou uma nave de sua raça, matou o capitão dela e ainda roubou-a. Mas tudo isso fica em segundo plano quando uma…um… algo vem em direção à Terra desligando todas as naves e estações que cruzam seu caminho e ainda criando uma onda de ventanias, raios e caos quando estaciona na órbita terrestre.

Logicamente que até agora isso não parece ser uma ofensa tão grande para a mente de ninguém e até poderia render uma história interessante, se a tripulação da Enterp… quer dizer da Ave de Rapina não conseguissem desvendar o segredo dessa nave em um minuto, coisa que a Federação e sua centena de cientistas estavam tentando há dias em vão. Na verdade o troço (não parece uma nave, ficando mais para um rolo de sushi ante de ser cortado, com um globo brilhante em uma das pontas) está lançando uma mensagem em resposta a uma outra que recebeu milhares de anos antes quando visitou o planeta. O canto de uma baleia cachalote, mas como elas foram extintas, bom o único jeito é dar uma passadinha no final do século XX, roubar um par delas e salvar a Terra.

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E como se ainda não tivessem se esgotado as desculpas esfarrapadas do roteiro escrito a oitos mãos pelos estreantes (na época) Steve Meerson, Peter Krikes, pelo produtor Harve Bennet e pelo ex-diretor da franquia Nicholas Meyer, não se preocupem, Capitão Kirk e sua tripulação ainda irão para o passado através de uma volta ao redor do sol. E querer entender isso (por mais que eles tentem explicar) é quase emburrecer um pouquinho.

E todo esse “esforço” narrativo só para panfletar contra a extinção dos gigantes cetáceos soa exatamente como deve soar: um completo desperdício e um exagero que afunda a franquia no mais profundo dos mares.

Mas tudo tem um lado bom

Tudo bem, eles conseguiram colocar a tripulação da Enterprise no ano recorrente ao filme (ainda que sem Enterprise), mesmo que isso não fizesse o menor sentido, já que existe um hiato de mais de 300 anos entre o presente deles e 1986 e achar que as baleias iriam sumir justamente naquele ano é um disparate narrativo que só serve para facilitar a vida da direção de arte, que não precisa inventar nenhuma bugiganga futurista. E isso está longe de ser uma razão suficientemente boa para mover essa trama.

Por outro lado, essa dinâmica dos personagens “perdidos” no passado tendo que transitar por essa “cultura primitiva e paranoica” (como Spock lembra em certo momento) acaba resultando em alguns momentos tremendamente divertidos. Melhor ainda, acaba dando espaço para o trio Scott, Checov e Sulu, três personagens quase sempre desperdiçados, mas que quando bem usados dão um tom farsesco e bem humorado em todas suas participações. O que acaba sendo o único real acerto de toda ideia em volta de Jornada nas Estrelas IV: A Volta Para Casa.

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E isso foi obviamente percebido pelos roteiristas a tempo de, mesmo que de modo preguiçoso, dividir esses três e dar a cada um deles um momento que pudesse ser deliciosamente lembrado pelos fãs da série. E não só isso, quem acaba ganhando com isso é, justamente, o trio principal, que não precisa ficar sobrecarregado de momentos divertidos e deixar que tudo se torne quase uma comédia. Melhor ainda, ao regredir Spock para aquele personagem cru e lógico, ganha algumas situações mais impagáveis ainda.

Agora, para quem estiver achando esquisito toda essa “graça” ser o melhor do filme, alinhava ainda mais o quanto esse quarto filme acaba descontrolado em todas suas situações. Pior, até quando se descobre bem humorado resolve ir além, e depois mais além ainda e, por fim colocar os personagens em uma sequencia digna de uma comédia pastelão fugindo das autoridades dentro de um hospital com uma trilha sonora que mais parece saída de um filme dos Trapalhões.

Ecochatice

Mas tudo isso só tem um objetivo, e não é salvar a humanidade nem homenagear a série criada por Gene Rodenberry e muito menos continuar a franquia, o único foco de Jornada nas Estrelas IV é deixar a mensagem positivista e responsável: Salvem as Baleias!

E se alguém chegar ao final do filme sem perceber isso, não se preocupe, por que Leonard Nimoy (mais uma vez na direção… depois de nem querem participar do segundo filme), vai esfregar na sua cara um dos momentos climáticos mais exagerados, melodramáticos e (ironicamente) anticlimáticos que, não só a franquia, mas, provavelmente todo cinema dos anos 80 viu. Algo pior que a pior das atuações de William Shatner, um momento que é melhor acreditar que é uma piada levada a sério do que uma conclusão envolvendo um casal de cachalotes, um baleeiro clandestino, um arpão, a temporada de caça à baleia no Alaska e um teletransporte. E bom… lógico que todos já adivinharam, mas quem viu o filme e chegou nessa parte já não tinha mais jeito.

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A sorte de tudo é a franquia não ter acabado nesse momento em que Nimoy aponta sua câmera para uma lépida baleia passeando pela futurística bahia de São Francisco em direção ao por do sol enquanto o bando de cinquentões da tripulação brincavam na água e se esqueciam completamente que aquilo se tratava ainda de uma ficção científica séria. Bom, nem tão séria assim.


Star Trek IV – The Voyage Home (1986), escrito por Steve Meerson, Peter Krikes, Harve Bennet e Nicholas Meye, dirigido por Leonard Nimoy, com William Shatner, Leonard Nimoy, DeForest Kelley, James Doohen, Walter Koenig, George Takei, Nichelle Nichols e Catherine Hicks


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1 Comentário. Deixe novo

  • marcio de gois vilela
    28/09/2023 19:45

    Respeito sua opinião, mas a mim foi um dos filmes mais divertidos e com uma mensagem muito positiva.

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