Christopher Robin Crítica

Christopher Robin: Um Reencontro Inesquecível | Uma fantasia irretocável sobre a infância esquecida


[dropcap]F[/dropcap]az quanto tempo que você não tira férias? Acha normal isso? Christopher Robins: Um Reencontro Inesquecível chega aos cinemas afirmando que não, não é normal. Trabalhar sem descanso é uma morte lenta, uma hibernação forçada enquanto as coisas boas da vida ficam esperando para sempre. E quem chega para nos contar isso tudo é o Ursinho Pooh, nos fazendo lembrar de maneira bem humorada, despretensiosa e despreocupada do poder do ócio e de como é importante no dia a dia lembrar do que valorizamos mais.

Produtividade pode ser uma maldição. Vivemos nessa era da eficiência, onde humanos que viram custos são dispensados sem nenhuma cerimônia. A história se passa na pós segunda guerra, o que é uma época tão sombria quanto, com pouco lugar de trabalho para tanta gente e um futuro incerto lá fora. Os criadores do Ursinho Pooh, A.A. Milne e Ernest Shepard, assim como os filósofos gregos, sabiam valorizar o não fazer nada. Em sua época ele entendia a necessidade do ser humano em não apenas trabalhar, mas também relaxar e gozar de nossas privilegiadas vidas pós revolução industrial. Se não, qual o sentido disso tudo?

Acompanhamos o crescimento do pequeno Christopher Robin (Orton O’Brien) e seu distanciamento dos seus melhores amigos: Ursinho Pooh, Tigrão, Leitão e Ió (o molenga burrinho e seu pessimismo divertido). Sua infância no internato, a morte do seu pai e a guerra tornaram o coração de Christopher (já crescido como Ewan McGregor) distante. Sempre preocupado com o sustento de sua família, ele agora se vê sem sequer o fim de semana de férias para passar ao lado de sua esposa e filha (Bronte Carmichael, demonstrando que às vezes a seleção de atores-mirins não está muito inspirada). Tendo que ajudar seu alheio chefe (o exagerado Mark Gatiss) a cortar custos, em um plano que inevitavelmente incorrerá em demissões, sua esperança de redenção reside na volta do ursinho mais amado das histórias e grifes infantis.

O filme segue uma estrutura simples, mas muito, muito fofa. Da correria e competição do mundo moderno emerge a mágica Disney e um ursinho que aparece justamente onde é necessário. Não há muitas explicações de como essa mágica funciona, e essa é a decisão mais correta do roteiro. A mágica perderia todo seu efeito se você descobrisse como as coisas são. E por isso os amigos de Christopher simbolizam tudo que há de mais lúdico e sincero em nosso mundo.

Não há malícia adulta nas piadas, mas justamente o contrário: a estranheza diante do mundo adulto. O que facilita acreditarmos que aquelas criaturas, agora mais velhas (note os pelos grisalhos de Pooh e Tigrão para se emocionar automaticamente), ainda são as mesmas, e que podem existir em nosso mundo, sem ser apenas fruto da imaginação de alguém com alto nível de estresse.

Christopher Robin

A animação dos bichinhos é impecável. Não apenas a textura de pelúcia, mas os movimentos dos seus corpinhos são um misto aceitável entre desenho e realidade. E a dublagem é o ponto mais forte. O intérprete de Pooh, Jim Cummings (que também faz o Tigrão), por exemplo, usa uma entonação envelhecida, adulta até, mas ao mesmo tempo sem inflexões de adulto (como cinismo, sarcasmo). Há uma certa reverência saudável pelo conteúdo original, principalmente a animação, que consegue realizar a ponte para o real devido a várias virtudes técnicas.

A fotografia, por exemplo, não exagera nas cores, mas quando se trata de um balão vermelho… bom, ele é vermelho mesmo, com todas as forças! E a direção de arte transforma até uma prateleira na cozinha em uma obra de arte que une o real com o nostálgico. E note como, apesar de ser um filme cheio de efeitos, a direção de Marc Forster privilegia planos mais fechados, que favorecem a interação de Christopher com seus bichinhos. Isso, ao mesmo tempo que ajuda no clima de intimidade entre velhos amigos, também demonstra uma confiança inabalável do poder da computação gráfica nos dias de hoje.

Com essa premissa moralista sobre como o trabalho nos escraviza, por mais improvável que pareça, Christopher Robin consegue se desvencilhar muito bem do velho clichê Disney e suas lições de moral no final do filme, e isso é graça à entrega incondicional de McGregor e dos dubladores, que concretizam para o mundo real um pedaço de fantasia irretocável que, assim com O Pequeno Príncipe, nos diz o essencial sem conseguirmos de fato ver onde isso está.


“Christopher Robin” (EUA, 2018), escrito por Alex Ross Perry, Tom McCarthy, Allison Schroeder, dirigido por Marc Forster, com Ewan McGregor, Hayley Atwell, Bronte Carmichael, Jim Cummings.


Trailer – Christopher Robin: Um Reencontro Inesquecível

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