A Conexão Francesa Filme

A Conexão Francesa | O outro lado da Operação França

A Conexão Francesa é um filme de máfia, mas passa longe dos estilos de Martin Scorsese (Os Bons Companheiros, Cassino) e da trilogia O Poderoso Chefão. Não chega nenhum momento a ser divertido. Mesmo nos momentos de humor fica difícil de rir. Ao mesmo tempo, não se dá ao trabalho de explicar a hierarquia das gangues, nem explora muito o relacionamento entre seus membros. É um filme tenso, mas ao mesmo tempo prático. No começo vemos que ele se inspira “levemente” em eventos reais, o que parece um eufemismo para um roteiro carregado, que se arrasta através dos acontecimentos em uma espiral constante de morte, violência e dor.

A história está completamente focada na caça iniciada pelo novo juiz de crime organizado, Pierre Michel (Jean Dujardin). Enquanto juízes geralmente passam longe do dia-a-dia dos policiais e investigadores, o personagem de Dujardin tem dois motivos para estar tão envolvido, a ponto de sair às ruas e fazer parte ativa das investigações: 1) antes era juiz de menores, e conviveu com famílias caindo em desgraça por causa do vício (uma delas é usada como gancho), e 2) ele mesmo caiu em um vício no passado (a jogatina).

Já o líder da gangue, Gaëtan ‘Tany’ Zampa (Gilles Lellouche) mantém um esquema aparentemente à prova de falhas, cooptando todos em volta – por bem ou por mal – e lembrando muito um governo amador. Bom, no fundo é o que máfias são. Ele passa de uma relativa tranquilidade nos “negócios” para um estado de alerta constante por causa do vigor de Pierre, cujas decisões enérgicas parecem fazer efeito no departamento que dirige. Quando o juiz manda a lei às favas e começa a emitir mandatos de prisão para cercar os seus comparsas, vemos o enorme esforço que é para a justiça se mobilizar, sendo que o efeito é um pequeno contratempo no lazer dos criminosos, como deixar um dos capangas sem sua mulher, que cuidava dos filhos, o que dá uma boa medida de quem é que está vencendo essa guerra.

Ao mesmo tempo, vemos Pierre e sua equipe agindo dia e noite em busca de qualquer brecha. Eles fumam e bebem demais. Seria essa uma comparação entre drogas lícitas e ilícitas? Seria esta uma crítica não às drogas e seu crime organizado, mas à própria guerra em si, fadada a fracassar inúmeras vezes até que alguém perceba ser uma luta sem sentido? Há muito do filme em torno do funcionamento da justiça e da resposta dos criminosos. Para qualquer ação, sempre parece haver uma reação oposta e muito mais incisiva. O clima de desesperança é imenso do começo ao fim, já que nós sabemos, espectadores de Tropa de Elite (1 e 2), onde isso vai acabar. A expressiva fotografia de Laurent Tangy também sabe. Aparentemente apaixonado pelos anos 70 onde a ação se passa, as luzes e o figurino parecem quase sempre impregnados das fumaças dos cigarros e de um indelével cinismo, presente de ambos os lados.

Ao mesmo tempo, a trilha sonora de Guillaume Roussel e as músicas escolhidas para datar o longa são icônicas, representam momentos da história, mas ao mesmo tempo chamam por uma nostalgia de uma época que parece se repetir à exaustão quando o assunto é guerra contra as drogas. Na verdade, qualquer tipo de guerra, e esse parece ser o lado moral que o diretor Cédric Jimenez parece posicionar o filme a todo momento, levando o espectador à exaustão de uma ação infrutífera. Segundo filme de ficção de Jimenez, sua estética obviamente parece mirar nas produções hollywoodianas, e por isso o resultado quase perde o charme e o aspecto cultural francês, talvez até de forma proposital, já que o departamento de narcóticos de qualquer país do mundo, quanto mais se esforça, mais parece caminhar para trás.

A Conexão Francesa Crítica

Jean Dujardin (O Artista) é uma cara fácil, que traz simpatia e confiança, mas que no fundo parece esconder o cansaço e a desesperança disfarçados de determinação. Muitas vezes o filme confunde-nos entre o incorruptível juiz Pierre e o líder da gangue Zampa, interpretado por Gilles Lellouche como um aparente bon vivant, pai de família ocasional, que preza por sua “família”, e sofre pelas perdas, mas ao mesmo tempo não conta as mortes necessárias para continuar com seus negócios intocáveis.

No entanto, a história dos dois soa como um pano de fundo muito pálido, ficando difícil entender quais as conexões com suas “profissões” ou até com suas próprias vidas. O preço que se paga em usar material de eventos históricos muitas vezes é perder aquele gancho, aquela reviravolta e aqueles elementos inseridos propositadamente pelos roteiristas. Aqui toda a história empolga, é interessante, mas não parece caminhar para nenhum lugar em específico, exceto a perseguição em si.

Ganhando no título nacional o título original do filme de 1971 com Gene Hackman que se passa em Nova Iorque (“The French Connection” virou “Operação França” aqui), essa é a ponta francesa do tráfico de drogas entre França e EUA, mas não deve se tornar tão famoso quanto o filme de William Friedkin. Curiosamente, é um dos filmes franceses mais americanos, já que máfia e corrupção parece ter sido uma criação que a máfia italiana nova-iorquina e os diretores de lá nasceram fazendo.


“la French” (Fra, 2015), escrito por Audrey Diwan e Cédric Jimenez, dirigido por Cédric Jimenez, com Jean Duardin, Gilles Lellouche, Céline Sallete, Mélanie Doutey, Benoit Magimel e Guillaume Gouix


Trailer – A Conexão Francesa

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1 Comentário. Deixe novo

  • Antes de tudo temos que voltar para 1972 e considerar alguns pontos de “Operação França”, trabalho de William Friedkin que levou o “Oscar” de melhor filme. Uma rede de narcotráfico que se estendia da riviera francesa até seu mercado consumidor, cosmopolita e sombria capital do mundo Nova York. As tensões raciais e a discriminação à “gentalha” de periferia fomentam as tensões contra o anti herói Jimmy Popeye interpretado por Gene Hackman à caça do líder do tráfico Alain Charnier, interpretado por Fernando Rey. Já em “A Conexão Francesa” temos o primeiro longa metragem de grande valor do Diretor Cédric Jimenez focando mais nas negociações escusas entre traficantes, comerciantes e policiais envolvidos, apresentando um pouco da organização da policia trabalhando com amparo pessoal do juiz responsável pelas investigações, participando inclusive pessoalmente de algumas operações de prisão, algo diferente para nós.
    O filme começa com o Prefeito da cidade de Marselha declarando guerra em rede pública de TV contra o narcotráfico, uma trama poderosa e muito bem articulada que tem a capacidade de produzir, atravessar o Atlântico e despejar centenas de quilos de heroína nas avenidas de Nova York com a leniência das mesmas autoridades que esmurram a mesa diante das câmeras. As semelhanças com seu antecessor – “Operação França”, 1972 – não se limitam ao ambiente pela narrativa transmitindo tensão a todo instante, violência regada a muito sangue e a traição pairando em todos os cantos. Por mais que o Diretor não tivesse a menor intenção de hastear bandeiras contra ou a favor pela legalização das drogas, a partir do momento que testemunhamos o lucro gigante menor apenas que o calibre das armas e a violência na repressão dos traidores, lógico que temos opiniões divididas variando de um para outro, potencializado ainda mais quando participamos da vida familiar do Juiz Pierre Michel – Jean Dujardin – cristalizando assim uma caça mocinho contra o bandido.
    Levando em conta que o Diretor busca oferecer tensão como forma de entretenimento o filme cumpre bem seu papel: enquadramentos fechados e pouca iluminação fomentam um clima sinistramente assustador proporcionados pelo eficiente trabalho de fotografia de Laurent Tangy, reconhecido pelo seu trabalho em “Carga Explosiva”, apresentando um dos vilões mais aterrorizantes que se tem noticia encarnado “Lúcifer” na Terra interpretado por Gilles Lellouche dando vida ao tinhoso Gaëtan “Tany” Zampa.
    A direção de arte com auxilio das maquiagens muito bem elaboradas permite um agradável e saudoso mergulho na era dos anos 70/80 bordejado por uma nostalgia extrema com bastante autenticidade, potencializada por uma trama que muito lembra roteiros hollywoodianos dos clássicos esfumaçados pouco iluminados dos anos 40/50 como os vilões vividos por Humphrey Boggart.
    O filme trata de um tema de Estado através de uma história muito bem contada com trilha sonora muito divertida dos anos setenta que impede que fiquemos paramos assistindo. Apesar de não ser novidade para nós as conseqüências do trafico de drogas já que vivemos num país que sofre muito com as conseqüências da forma equivocada como é tratada. Notamos enfim que tudo não passa de uma mascara que se dá o nome genérico em qualquer lugar do planeta que chamamos assim de “políticas de combate”.

    RK

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