127 Horas Filme

127 Horas | A esperança presa a uma pedra


É difícil até pensar que um dos filmes mais empolgantes e movimentados dos últimos tempos seja sobre um cara que, durante 80% do tempo, fica lá, preso a uma pedra. Dar ritmo a isso é para poucos e entre esses, não existe dúvidas, que o inglês Danny Boyle seria um dos mais indicados, assim como seu 127 Horas é a prova disso.

Acostumado a conviver com personagens sozinhos em situações que lhes obrigam a ultrapassar seus limites para chegarem vivos ao final de seus filmes (Transpotting, A Praia, Cova Rasa, Extermínio e Sunshine), Boyle embarca então, com propriedade, nesse projeto que parece voltar mais à suas raízes, justamente depois de levar o Oscar com Quem quer ser um Milionário, que parece destoar totalmente de seu, digamos, modus operandi.

Em 127 Horas ele embarca na história de Aron Ralston, um engenheiro de alguma megalópole qualquer que faz sempre questão de ¿fugir¿ desse ritmo frenético e tumultuado e seguir nessas viagens solitárias em busca de um pouco de aventura. É em uma dessas, que Aron acaba então ficando preso a uma rocha, no meio de um deserto, e termina por ter que amputar o próprio braço para conseguir sobreviver.

Não isso não é um spoiler, e Boyle, mais do que qualquer um, sabe disso. Por mais que seja esse momento pelo qual o filme sabe que tem de chegar, o que o move é esse personagem e seu desejo de sobreviver, custe o que custar. E é ai que entra a genialidade de 127 Horas e o modo azeitado como todas engrenagens se movem.

De um lado Boyle e Simon Beufoy voltam a escrever juntos (ganharam o Oscar por Quem quer ser um Milionário) e optam por criar essa história que, aos poucos, vai mostrando esse personagem à procura de seu limite, que passa como um turbilhão pela vida das duas garotas perdidas no deserto e parece sair de casa apressado, como se nada mais importasse naquele momento a não ser, se ver naquela estrada. Um desejo imediatista de chegar nessa sua verdadeira casa.

Boyle e Beaufoy criam esse cara confortável em sua solidão, mas que, preso àquela pedra, acaba descobrindo o quanto, na verdade, ele está bem longe de estar sozinho nesse mundo. A dupla então não se perde em flashbacks melancólicos, mas sim em uma tentativa de desenvolver esse personagem, suas motivações e como tudo isso reflete nessa imensa força que não o deixa desistir. Ao personagem é permitido divagar sobre seus erros, mas não como arrependimentos e sim como lições que ele tem que aprender para ultrapassar aquela pedra (no sentido figurado ou não) em seu caminho.

É tremendamente divertido o título do filme sendo apresentado quase com um lembrete, uma contagem regressiva do tempo que resta para aquele personagem, e isso, de modo tão súbito que não deixa o espectador se preparar para pensar no que ficou para trás e vai, com certeza, fazer falta. Tanto Aron, quanto todos de frente para o filme serão pegos de surpresa e se tornarão mais que testemunhas, mas companheiros nessa situação.

Por isso, não se surpreenda se, depois de passar por tudo com esse cara preso àquela rocha, sozinho, o estalo de seu osso quebrando permaneça nos ouvidos de todos por horas depois do fim do filme, assim como a aflição do nervo sendo cortado que toma a todos. Aqui um detalhe, ainda que a cena da tal amputação acabe sendo ¿falada¿ pelo conteúdo visual, ela em si pouco tem de muito diferente de milhões de outros filmes sanguinolentos que aparecem nos cinemas, a diferença aqui é que, como em pouquíssimas produções, o espectador sente cada pontinha de dor do personagem, e isso é um trabalho que está sendo feito desde o primeiro frame do filme, não só em um momento de gore puro e simples.

Mas esse mergulho, provavelmente, não seria possível sem a presença do ótimo James Franco (que cada vez se mostra mais habilidoso e centrado em seus papeis, sempre diversificados e marcantes) que, além da simpatia necessária, deixa extrapolar esse cara comum, essa personalidade magnética, mas que pode ser encontrada em qualquer esquina do mundo, ao mesmo tempo em que, hora alguma, se deixa levar pelo melodrama da situação e opta, simplesmente, por sumir por trás do personagem e deixar que o sentimento de tudo aquilo seja mais forte que qualquer atuação mecânica.

É impressionante como Franco não parece ter medo da câmera, que praticamente permanece colada em seu rosto a maioria do tempo, sem vergonha de deixá-la penetrar em sua alma, nu de qualquer intenção de se colocar á frente desse homem real, com sentimentos reais e um deseja real de sobreviver preso àquela pedra. Um verdadeiro show em uma atuação corajosa e inesquecível.

Por outro lado, é Danny Boyle quem parece perceber o quanto Franco parece à vontade e não tem o mínimo de medo de apontar sua câmera para ele e ir à procura desse personagem que vai se despedaçando nessa situação. Sobra também para Boyle fazer com que 127 Horas não se perca em falta de interesse, já que as opções visuais acabam sendo tremendamente pontuais (sem poder sair muito daquela pedra), mas que é compensado por um estilo visual tremendamente marcante e que, junto com a montagem de Jon Harris (que trabalhou em ¿Snatch¿), criam esse ritmo frenético e sempre em busca de um novo ângulo ou composição.Cenas do Filme 127 horas

Mesmo com tão poucas opções, é graças a essa inquietação visual que 127 Horas não se perde nem por um segundo, seja com a câmera no fundo da garrafa de água, mostrando o quanto ela vai secando, ou dentro da mangueirinha do cantil (e até olhando dentro do braço do personagem). Por mais incrível que possa parecer, é fácil acabar o filme com a impressão de que Boyle não repetiu ângulos e movimentos de câmera. Mesmo quando foge da fenda até o céu, que pela primeira vez deixa o pedido de socorro do personagem se calar no silêncio do deserto, um movimento que faz mais de uma vez, mas cada um com um intuito tão diferente que o espectador é incapaz de notar tal repetição.

Mas sobre tudo isso é impossível não perceber o quanto 127 Horas é sobre esperança, uma lição de como ultrapassar tudo que vem em seu caminho para lhe atrapalhar. Um modo de dizer que o que todos têm de fazer depois de uma noite fria é ir a busca desse calor do sol, mesmo que seja só um feixe de luz que dure poucos minutos. Assim como para lembrar a todos que o melhor a fazer depois de tanto sacrifício é olhar para trás e tirar uma foto, já que o que move as pessoas é saber que sempre há um jeito de sair de qualquer situação, e fazer o espectador acabar um filme lhe permitindo pensar sobre isso tudo não é para muito e Danny Boyle, com seu 127 Horas, consegue isso como poucos.


127 Hours (EUA, 2009), escrito por Danny Boyle e Simon Beaufoy baseado no livro de Aron Ralston , dirigido por Danny Boyle, com James Franco, Kate Mara, Amber Tamblyn. Treat Willians, Kate Burton e Clémence Poésy .


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1 Comentário. Deixe novo

  • Olá !!

    Assisti e super recomendo ! o filme é incrível, achei que seria maçante por ser quase todo na mesma locação, mas me surpreendi com as lições nele contidas ! Um filme reflexivo que nos faz pensar e mostra uma lição de vida, superação e esperança !
    Muito bom mesmo !

    Um abraço e boa semana !

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