The Cave | Pertinente, porém organizado demais


[dropcap]A[/dropcap]traso de vinte minutos. Sala lotada em uma tarde chuvosa. Quando acho que finalmente vai começar The Cave, um dos documentários indicados ao Oscar esse ano, percebo o nível de promoção ao filme quando somos introduzidos a um historiador da PUC que irá nos mostrar um gráfico no tempo das tomadas de território em torno da região onde se passa a produção, falando por alguns minutos para nos dar o panorama histórico do que ocorreu e está ocorrendo no Oriente Médio naquela região. Ele possui descendência libanesa e o conflito se passa próximo das fronteiras com a Síria.

A promoção ao filme continua durante o filme. O diretor Feras Fayyad aceita efeitos dramáticos e estéticos em uma introdução comercial de uma área onde pessoas apenas sobrevivem em meio a disparadas de mísseis russos durante o dia em uma cidade já completamente destruída. O que estamos prestes a testemunhar na sala de cinema é um espetáculo, e isso incomoda depois que começamos a ver crianças machucadas entrando na sala da Dra. Amani Ballour.

Ela é pediatra e diretora de um hospital que ainda existe em solo sírio por estar abaixo dele. Através de um sistema de túneis, essas pessoas mantém uma sala de cirurgia, uma cozinha e provavelmente muito mais. Cento e cinquenta funcionários possui o hospital, mas mal podemos entender a geografia do local que nos é mostrado, que dirá o resto do local. As imagens capturadas possuem a fúria da guerra e a devida homenagem aos seus heróis invisíveis, mas não é um documentário muito rígido no que diz respeito a informação.

O objetivo de Fayyad é gritante desde o começo: preciso divinizar esta mulher de trinta anos que hoje controla um hospital onde está sitiada há cinco. Ele prepara sua câmera para os momentos que precisa e os seleciona com uma pauta em mãos. Vemos sua autoridade como diretora sendo desafiada por um paciente, por ser mulher. Vemos a morte de um filho pela reação da mãe e a esperança dos funcionários ir abaixo. Vemos Amani dizendo toda frase clichê sobre a humanidade espalhado pelo filme. Fayyad faz todo o serviço de horas de filmagem parecer fácil, mas seus objetivos estão tão destacados daquela realidade horrível que a história desta verdadeira mártir soa como promoção.

Para proteger o anonimato da família que espera por seu retorno apenas ouvimos as gravações no celular, além da imagem constante das suas flores, que a aguardam. O celular neste mundo de opressão possui a função bizarra de nos relembrar a todo momento que estes são os tempo atuais, apenas distante no espaço, muito longe de nossos lares. O celular também é usado pelo cirurgião para ouvir música clássica, e o filme, em um dos momentos mais brilhantes, transpõe essa música da sala de cirurgia para as ruas da cidade, cheias de entulhos e sobreviventes correndo como ratos.

A maior virtude deste documentário e dos tempos atuais é a captura de imagens impossíveis de saírem daquele local sitiado. The Cave nos entrega isso em um formato comercial e agora sua visibilidade é imensa. Mesmo destituído de qualquer virtude cinematográfica, apenas a sua exposição já compensa toda promoção de cenas horríveis. Pelo menos isso é o que imaginam seus idealizadores.


“The Cave” (Din/Ale/Fra/UK/EUA/Qat, 2019), escrito por Alisar Hasan e Feras Fayyad, dirigido por Feras Fayyad, com Amani Ballour e Salim Namour.


Trailer – The Cave

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