O Mestre

Não há dúvidas que hoje em Hollywood, mesmo tomado por essa onda de adaptações e continuações, ainda existe gente em busca de um significado maior do que aquele que, simplesmente, está sendo projetado na tela do cinema. Paul Thomas Anderson (de Sangue O Mestre Poster FilmeNegro e Magnólia) é uma dessas certezas, e seu novo filme, O Mestre é uma dessas provas.

Porém, diferente de outros nomes como, Terence Malick (A Árvore da Vida), Anderson além de toda sensibilidade, significado e inquietação, opta sempre pela narrativa concisa, linear e com um controle de cena que o coloca ao lado de gênios como Martin Scorsese. Nada nunca está fora do lugar, ao mesmo tempo em que não permite que suas opções esbarrem naquele chamado “cinema de arte” e sejam negadas pelo grande público (como acontece com Malick). Anderson faz filmes para todos que se aventurarem no escuro da sessão.

Mesmo com imagens estáticas e andamento lento, O Mestre, não fica um segundo sequer perdido em qualquer tipo de divagação artística, ainda que, tampouco se permita não ter significado. O segredo talvez esteja naquele segundo em que a cena deixe de ser só um plano e se transforme em uma obra de arte (tanto em termos estéticos quanto narrativos).

O espectador é então apresentado a esse personagem perdido mesmo no meio de toda tripulação de seu navio enquanto volta para casa depois do fim da guerra. Ele é Freddie Quell (Joaquim Phoenix) um marinheiro alcoólatra e com desvios sexuais suficientes para deixar incomodada toda tripulação ao seu redor enquanto “brinca” com uma escultura de areia. Um cara que talvez tenha sido destruído pela falta de esperanças do fim da guerra, mesma que criou esse monte de olhares perdidos e psicopatas de plantão.

Isso até o dia que acaba descobrindo que seu destino, na verdade, está, justamente, em um outro barco, dessa vez junto de Lancaster Dodd (Philip Seymour Hoffman), “um escritor, filosofo, físico nuclear e, mais importante, um homem” que está à frente de uma nova religião/culto/seita chamada “A Causa”. Dodds faz então desse homem destruído seu grande material de pesquisa para provar sua teoria, trazer esse “animal” para fora de sua jaula e ensinar-lhe a razão.

Anderson então cria essa dinâmica na qual, Quell, encontra um motivo para parar de correr em direção ao horizonte sem destino, enquanto Dodd tem a oportunidade de colocar em prática essa teoria que já começou a angariar seguidores por todos Estados Unidos. Na verdade, mascarado por esse desejo quase egocêntrico (de Dodd), Anderson ainda provoca o espectador a encarar o veterano de guerra como aquele lado emocional que o Mestre (como é chamada dentro da igreja) sempre tenta se abster, ainda que não consiga, como nas oportunidades em que é questionado sobre as “verdades” de sua “Causa”. Melhor ainda, Quell acaba servindo de ferramenta violente e implacável contra aqueles que se mostram contra “A Causa”, talvez aquela projeção do ID que Dodd tanto tenta combater.

O Mestre Filme

O diretor então cria esse filme divido entre razão e emoção. De um lado Quell, do outro a esposa de Dodd, Peggy (Amy Adams). E isso, literamente falando, já que a vivência dos dois na tela se resume sempre a um dos cantos dela, influenciando as ações de Dodd e espremendo-o para esse caminho onde, na verdade, só um dos dois conseguirá acompanhá-lo. Durante todo o tempo, Peggy parece se espreitar pelo canto direito da tela, apontando a razão para o marido, lembrando-o daquilo tudo que ele não deixa de pregar para seus fieis. Até quando permite que o animal dentro de Dodd se mostre (aproximando-se dele por seu lado direito), o masturba enquanto lhe coloca de volta nos trilhos de sua vida e de sua religião. Para ela, Quell é o perigo. O empecilho. Aquele “espécime” sem salvação que acaba se tornando uma exceção perigosa para o sucesso.

Por outro lado, Quell não só se torna o objetivo de Dodd como, sem saber, acaba sendo aquela pequena brecha que ele precisa para poder tomar aquela bebida maluca e forte ou rolar na grama de felicidade. Quell permite a Dodd ser “aquele homem” que ele fez questão de citar enquanto se apresentava para ele no primeiro encontro entre os dois.

Com isso em mãos, Anderson faz então um filme rico em significados, que desloca Peggy de lado quando ela parece se deixar levar pela emoção em uma mesa de jantar, já que só quer tirar Quell da equação, enquanto do outro lado, permite que o marinheiro vá e volte dentro de sua própria razão. Do mesmo jeito que o espectador só é apresentado a face esquerda (direita da tela) de Quell assim que ele encontra Dodd, cada vez que ele se deixa levar pela sua animalesca personalidade autodestrutiva e violenta sobrecai sobre seu rosto uma iluminação que tira seu olhar perdido de dentro do escuro. Guardando sua face iluminada nos dois hemisférios somente quando ele é obrigado e tomar seu verdadeiro caminho. Aquele que define seu destino.

É lógico que se dissecado, O Mestre ainda guarda uma série enorme de detalhes que dividem a tela nesses dois lados contrários (como alguns cigarros amarrados dois a dois), o que é um deleite para os fãs de um cinema sustentado pela visão artística de um gênio como P. T. Anderson. Ainda mais na companhia desse trio de atores, todos em momentos especiais de suas carreiras e com resultados que fazem o espectador sair atordoado de dentro do cinema.

O Mestre Filme

De cara, a criação de Joaquin Phoenix choca pelo caco, pelo resto de ser humano que ele se torna, arcado sobre os próprios ombros, como se não andasse, mas sim tropeçasse e fosse sendo levado pela gravidade. Um olhar quase trágico, sempre dolorido (como se o lado direito de sua face não respondesse aos estímulos) e que não parece conseguir focar em nada. Phoenix então desvenda seu personagem em tristeza e violência, como se daquele corpo corroído ainda vivesse um animal prestes e se chocar contras as grades que o cercam.

Do outro lado, Adams é fria, sem qualquer tipo de sentimento, mas com um olhar que parece sempre ter um foco, na maioria das vezes o próprio Seymour Hoffman, em mais uma criação genial, preciso, sempre vivendo entre esse limite da razão e da emoção e tendo a oportunidade de ser a contrapartida poderosa da ferocidade de Phoenix.

Por fim, é interessante perceber a sutileza com que o roteiro (também escrito por Anderson), ainda que exale essa adaptação da criação da própria Cientologia (aquela religião famosa entre os atores de Hollywood, incluindo Tom Cruise), nunca se deixe levar por esse caminho, o que torna o filme mais forte ainda. É lógico que uma pesquisa rápida aponte diversos pontos (e não são poucos) entre a vida desse Lancaster Dodd e a de L. Ron Hubbard (“pai da Cientologia”), principalmente quando debate certos dogmas de suas crenças (o que, com certeza, não deixou a famosa igreja muito feliz), mas sobre tudo isso, Anderson prefere contar uma história poderosa e sensível. Não em busca de uma crítica vazia a uma seita ou igreja (seja a Cientologia ou a própria “Causa”), mas sim de um significado. De personagens, decisões e caminhos.


The Master(EUA, 2012) escrito por Paul Thomas Anderson, dirigido por Paulo Thomas Anderson , com Joaquim Phoenix, Philip Seymour Hoffman, Amy Adams, Rami Malek, Laura Dern e Jesse Plemons.


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3 Comentários. Deixe novo

  • Thiago Dantas
    29/01/2013 7:45

    Eu tinha achado o filme maravilhoso. E gostei muito de seu texto. Só que aí li o comentário de Mauro e mudei de opinião. O filme é uma merda. Ponto. E duvido que sejas capaz de refutar essa fala tão embasada.

  • Vinicius Carlos Vieira
    28/01/2013 21:40

    O que seria do mundo sem a opiniões objetivas.

  • O filme é uma merda. Ponto.

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