Cinefilia Crônica | … a resposta devia estar no começo do filme… que perdemos


[dropcap]N[/dropcap]o primeiro trailer, já quero estar confortável na minha poltrona, com o refrigerante no suporte para copos e a pipoca no colo. Às vezes, ela acaba com menos de 15 minutos de película. Compro com antecedência, escolho um bom lugar – de preferência nas fileiras mais próximas ao corredor, uma prevenção para eventuais e improváveis acidentes, prestando atenção às rotas de fuga, essas coisas.

Deve ser a mania de chegar antes. Sou dos que coloca o despertador para tocar às 6h e às 5h30 já começa a ensaiar o dia. Dos meus grandes temores na vida, o de chegar atrasado está à frente de animais exóticos e morrer cedo.

Sabia que seria colocado à prova ao combinar com a galera uma ida ao cinema na última semana. Em tempos de internet para tudo, vi as melhores sessões com antecedência. Não faria sentido ir até lá sem saber os horários. O risco de enfrentar filas, perder a estreia e ter de me conformar com uma comédia meio bobinha ou um lanche para não perder a viagem me deu calafrios, mas segui adiante. Conheço bem o pessoal. Viro piada por me antecipar a tudo. Mas fui, não quero ser tão chato.

Tudo combinado, cheguei no horário. Aliás, antes do horário, como de praxe. E o tempo passando. Olhava o relógio a cada cinco minutos, sem que isso acelerasse os ponteiros. Virava o pulso para controlar a compulsão com o tempo. Ensaiava uma reclamação para o grupo. De nada resolveria.
O horário da sessão chegou. A galera, não. A fila de pessoas entrando na sala me dava medo. Não poderia me preparar durante os trailers, tampouco perceberia pouco sal na pipoca nas primeiras mastigadas.

Enfim, chegaram. E foram comprar os indispensáveis baldes de pipoca, não sem antes de discutir entre doce ou salgada. Precisavam de refrigerante, para não secar a garganta. E um chocolate, porque ninguém é de ferro. Alguém precisava urgentemente ir ao banheiro, melhor que sair no meio do filme.

Se já perderíamos os trailers, só uma intervenção divina nos faria chegar às poltronas vazias antes do começo da exibição. Notei que mal puxavam assunto comigo, já estava tudo arruinado mesmo.
E aí foi aquele ritual: a tentativa de achar bons lugares com a sala toda escura, o passo a passo aos tropeços, os pedidos de licença, as tosses irritadas de quem garantiu o lugar na hora certa, minha cara fechada pelo horário atropelado.

Queria entender como essa galera não liga de pegar o filme no meio do caminho, com seus cinco ou dez minutos iniciais já passados. Para mim, há um ritual. Preciso acompanhar os primeiros passos e aguardo até a última letra dos créditos para garantir um entendimento total, uma absorção completa.

Nada tinha mais graça e toda pergunta seria respondida com um seco “a resposta devia estar no começo do filme, que perdemos”. Aproveitei que o filme já estava perdido e tirei um cochilo ali mesmo. Ando trabalhando muito, meus horários são confusos.

Confusa também ficou a galera, que não entendeu bem a história. Parece que perderam alguma cena importante que explicava tudo e só fazia sentido na cena final. Uma fala, uma revelação, coisa assim. Dei poucos palpites. Fiquei revoltado com o atraso, mas infelizmente não ronquei. Seria uma boa maneira de protestar.

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