Abraços Partidos Filme

Abraços Partidos

Uma das tarefas mais difíceis na hora de criticar um filme talvez seja olhar de frente uma obra de um gênio indiscutível, como o espanhol Pedro Almodovar, e conseguir enxergá-la como um desastre, um exercício que o público geral dá como uma verdadeira missão de vida, já que aparentemente a função do crítico é “esculhambar” o que é “legal”, só elogiando o que é “chato”. Abraços Partidos é um verdadeiro prato cheio para essas pessoas.

Aquele que falar mal do novo filme de Almodovar vai estar “batendo” por “bater”, o coitado que falar bem nem se diga, e o grande problema disso é que, sem a mínima hipocrisia, seu filme acaba ficando nessa corda-bamba, ainda que, bem lá para o final acabe caindo para um dos lados e deve decepcionar até o maior dos fãs.

Se por um lado o diretor volta a atacar, sem o mínimo pudor, em mais um daqueles filmes sem gênero, como adora fazer, acaba derrapando exatamente nisso, pois se perde diante do próprio melodrama pendendo para um suspense onde nada acontece realmente, se tornando refém de um saco de surpresas que, quando ocorrem, não conseguem trazer toda força que o roteiro parecia clamar a cada sequencia. Como se Almodovar tivesse ficado impossibilitado de achar o tom apropriado, deixando seus personagens, sempre tão complexos, apáticos diante de toda trama, movidos por situações e não por ações.

O grande problema, e que vai criar uma grandicíssima confusão, é que diante de uma fraqueza esquemática de seu roteiro, Almodovar compensa tudo com uma direção impecável e inesquecível, que vai muito além daquele jeito espalhafatoso onde cores e formas pulam aos olhos do espectador, criando um filme digno de seus melhores trabalhos. Mais do que nunca o cineasta parece dominar completamente a linguágem cinematográfica, resultando em um filme que parece ávido a contar uma história a cada sequencia, mostrando, como sempre, muito mais do que os olhos simplesmente vêem, enriquecendo cada angula de câmera, não só com aquela beleza caracterísitica de seus filmes, mas com símbolos e significados que deixarão todos à vontade para ver e revê-lo sem se preocupar em repetir sua experiência.

Ainda que talvez esse visual impressionante se dê ainda pela parceria com o diretor de fotografia Rodrigo Prieto (parceiro do mexicano Alejandro González Iñárritu), Almodovar, mais que nunca, tentar provocar sua platéia diante dessa história a tentar entender o que está vendo e sentindo, mesmo que, diante do roteiro essa leitura se torne um pouco óbvia, mas ainda assim interessante.

Se em um primeiro instante, o roteirista cego, Harry Caine, vivido por Lluís Homar se diga finalizando um roteiro, escrevendo um epílogo, Almodovar na verdade dá a ele essa mesma chance de mostrar ao público que naquele momento o que ele faz é escrever o epílogo de sua própria vida, mesmo que para isso tenha precisado perder aquela ferramente que lhe permitia ser o que ele foi a vida inteira: o diretor de cinema Mateo Blanco. Almodovar, como de costume, faz um filme sobre pessoas ávidas por uma segunda chance, que olham para trás e vêem suas vidas interrompidas, mas que precisam juntar as fotos rasgadas para um segundo passo, mesmo que nenhum dos envolvidos vá ver o resultado. Em um mundo que quase todos precisam correr atrás de seus passados que voam sob seus pés, para tentar entender qual o próxima ação em seu futuro.

O diretor não foge do estudo de seus personagens, muito menos de encarar todo aspecto trágico da maioria deles, colocando mais uma vez nas costas de sua mais nova musa, e ótima, Penelope Cruz o peso do centro desse redemoinho de emoções, em uma personagem sofrida e, por que não injustiçada, pelo mesmo melodrama que carrega o filme. E é essa carga dramática que fará com que muitos torçam o nariz para o filme de Almodovar, já que, com ela, o cineasta acabe por criar um clima carregado que não consegue se dissipar diante do final.

Almodovar deixa aflorar seu lado pintor em cada um de seus enquadramentos, assim como acaba deixando escapar por entre seus dedos sua faceta roteirista, mesmo caprichando em um quebra-cabeça narrativo onde cada cena é uma peça. Talvez sofra um pouco com uma falta de bom-humor, ou até de uma linearidade mais conclusiva, já que o filme se passa em duas épocas e o roteiro parece se esforçar pouco para ligar seus pontos, mas ainda assim será lembrado como um filme acima da média, já que os gênios, mesmo em seus piores momentos, ainda são gêniais.


Los Abrazos Rotos (Esp, 2009) direção: Pedro Almodovar com: Penelope Cruz, Lluiz Homar, Blanca Portillo, José Luiz Gómes


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